Bíblia

Alegria do encontro de irmãos


Breve comentário do Salmo 133 (132).


Frei Carlos Mesters


Primeira tradução


1 Vejam como é bom, 
  como é agradável
  os irmãos viverem unidos!
2 É como óleo perfumado sobre a cabeça,
  descendo pela barba, a barba de Aarão;
  descendo sobre a gola de suas vestes.
3 É como o orvalho do Hermon,
  descendo sobre os montes de Sião.
  Pois é por aí que Javé manda
  a bênção e a vida para sempre!
Segunda tradução

1 Oi, que prazer, que alegria
  nosso encontro de irmãos!
2 É como um banho perfumado,
  gostosa é nossa união.
3 Sereno da madrugada,
  gostosa é nossa união.
  É vida que dura sempre,
  gostosa é nossa união.
Este é o penúltimo dos salmos de romaria. Os romeiros estão em Jerusalém, já entraram no templo. É festa! Nas romarias, uma das coisas que mais alegram o romeiro é se sentir acolhido como irmão ou irmã no meio de tanta gente.

O encontro é vivido como amostra do que se espera. Uma espécie de profecia viva. Talvez não ensine nada de novo, mas isso não é o mais importante da romaria.

O que importa é o que dizia um romeiro que participou de um encontro de comunidades de base: "Coisa nova não aprendi, mas enchi o tanque para o resto do ano!".


Apresentamos duas traduções. A primeira, com pequenas diferenças, é da Bíblia Pastoral. Tradução bonita e fiel. A outra, uma adaptação brasileira de Reginaldo Veloso. Através de canto e imagens, ela recria em nós a experiência que o salmo suscitava no povo daquele tempo.

O salmo tem um pensamento que se desenvolve em três partes: chama a atenção para a alegria da convivência fraterna dos romeiros no templo (v. 1), traz as comparações do óleo e do orvalho para expressar o significado dessa grande confraternização (v. 2 e 3a) e conclui que é através da união fraterna que a benção de Deus desce sobre a vida do povo (v. 3b).


Oi, que prazer, que alegria!
Vejam como é bom, como é agradável os irmãos viverem unidos! (v. 1)

O salmo 133 canta a confraternização vivida em Jerusalém na festa da romaria. O povo passa o dia reunido na grande esplanada do templo.

Gente de todos os cantos do mundo, que mal se conhece, aqui se encontra como irmãos e irmãs da mesma família e vive a alegria profunda de estar unida na mesma fé.

É a fé em Javé que faz dessa gente uma grande família, um povo unido.

Essa união é uma amostra concreta do futuro que essa gente espera e pelo qual luta.

Bom e agradável são as palavras com que o salmo define o que se vive em Jerusalém no dia da festa.

Quem já participou de um encontro assim, entende a alegria imensa que aí se comunica e percebe a beleza da união que se transmite como Boa Notícia de Deus a todos.


É como perfume! É como orvalho!

É como óleo perfumado sobre a cabeça, descendo pela barba de Aarão; descendo sobre a gola de suas vestes. É como o orvalho do Hermon, descendo sobre os montes de Sião (v. 2-3a).

Essas duas comparações, tiradas da vida, são como uma pedra que cai num lago: produzem círculos na imaginação criativa do povo que escuta e reza o salmo.


Óleo e perfume - O óleo era usado na alimentação e também amolecia os músculos para a luta. O óleo perfumado enchia a casa quando a visita chegava e enchia o templo em dias de festa.

É como quando o pessoal chega para a festa: roupa nova, banho tomado, vestido e corpo perfumados com água-de-cheiro.

O óleo era também usado para consagrar o sacerdote e o rei a serviço do povo de Deus.

O povo todo é visto como ungido, pois é comparado com o sacerdote Aarão, o irmão de Moisés.

O povo reunido no templo, celebrando os louvores de Javé, é um povo sacerdotal.


Orvalho do Hermon - Na terra árida da Palestina, o orvalho é sinal de vida e garante, apesar da falta de chuva, uma boa colheita.

Naquele tempo, o povo pensava que o orvalho descesse de modo invisível dos cumes das montanhas para se espalhar pelas planícies.

O monte Hermon, alto e misterioso, coberto de neve eterna, situado na fronteira nordeste da Palestina, até hoje é fonte de vida para toda a região. Quando se produz o degelo, ele alimenta as fontes do rio Jordão, cujas águas vão descendo, irrigando a terra, trazendo benção e vida para o povo, pão para comer.

O Hermon é símbolo de fertilidade.

A grande confraternização dos romeiros vivida no templo durante a romaria é o orvalho do povo, o orvalho invisível do Hermon que cai sobre os romeiros, irrigando a vida, produzindo fertilidade e frutos para todos.


Fonte de benção, vida para sempre!
Pois é por aí que Javé manda a benção e a vida para sempre! (v. 3)

A benção de Javé é muito concreta. Ela se manifesta na natureza, no óleo, no orvalho, nas chuvas, nas águas do Jordão que irrigam a terra.

Ela tem a ver com a fertilidade da terra e com a vida do povo.

Ela se manifesta nessa confraternização alegre e feliz das romarias.

Quando o povo vive unido, a benção de Deus desce.

Como diz o canto: "Onde o amor e a caridade, Deus aí está!".

O caminho para alcançar a benção de Deus e a vida para sempre é a união de todos em torno da fé em Javé, celebrada e vivida nos dias de romaria.

Quando todos se unem no templo, antecipam o futuro por alguns dias, numa intensa alegria.

"Nisso todos saberão que vocês são meus discípulos, se tiverem amor uns para com os outros" (Jo 13,35).


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Frei Carlos Julhoters é biblista, autor de diversos livros. Há anos acompanha a caminhada das comunidades eclesiais do Brasil. Atualmente, trabalha no Instituto Bíblico de Angra dos Reis/RJ.