Povos indígenas

Pequenas vitórias e grandes temores

Um povo considerado extinto mostra que está disposto a reconquistar a terra que é sua e ressuscitar sua cultura.

O cacique Francisco de Assis Araújo, conhecido como Chicão, enche o peito de orgulho quando lembra as histórias de seu povo. Fala dos guerreiros que lutaram em várias revoltas populares e cita Canindé como exemplo a ser seguido.
No final do século 17, João Fernandes Canindé, "rei dos Xucuru", organizou a resistência indígena contra os colonizadores portugueses no Nordeste. Xucuru, Paiacu e Icó, habitantes das ribeiras do rio Açu, combateram por mais de sessenta anos. Chicão diz que hoje, nos rituais celebrados por seu povo, Canindé "ocupa lugar de destaque, recebe homenagens".
Antônio Pereira, companheiro do cacique, ajuda o chefe nessa lembrança. Ele fala das promessas de documentos de terra que seus ancestrais receberam, ainda no século passado, quando foram mobilizados para lutar na Guerra do Paraguai. Até hoje, os Xucuru estão esperando.

RECONQUISTA DA IDENTIDADE - Os quase 6 mil Xucuru vivem no município de Pesqueira/PE, a 220 quilômetros de Recife. Já na década de 60, foram dados por extintos. Muitos viraram empregados dos fazendeiros dentro de sua própria terra, outros emigraram para regiões vizinhas. Alguns são pequenos agricultores que cultivam mandioca, feijão e banana em minúsculos pedaços de terra.
Chicão, Antônio Pereira e mais alguns Xucuru que restaram conscientes de sua etnia resolveram, então, batalhar pela reconquista de sua identidade como povo. E, sem terra, isso seria impossível.
Em março de 1992, conseguiram uma primeira vitória, quando o então presidente da República, Itamar Franco, reconheceu o relatório elaborado por um grupo de trabalho instituído pela Funai. O estudo comprovou que os Xucuru são os verdadeiros donos de uma área de aproximadamente 27 mil hectares de terra.
Foi o primeiro passo. O processo que garante a posse definitiva da terra está amparado no decreto 22/91. Inclui um rosário de formalidades legais e pode levar anos. A primeira fase é a da identificação do povo indígena e da área que está sendo reclamada. Depois vem a delimitação e, em seguida, a demarcação física da terra, isto é, a colocação de marcos. Depois de um longo vaivém pelos corredores da Justiça, chega a vez da homologação, que consiste na assinatura do decreto pelo presidente da República. O processo de demarcação só chega ao fim, em seguida, com o registro da área demarcada no Cartório de Registro de Imóveis da Comarca e no Departamento do Patrimônio da União.

NA MIRA DOS FAZENDEIROS - No caso dos Xucuru, só ago-ra é que se chegou à fase da demarcação física do território. Aqui, as comunidades indígenas participam ativamente, colaborando na abertura de atalhos e colocação de estacas.
Em geral, essa fase costuma ser a mais perigosa, porque provoca a ira dos grandes interessados nas terras indígenas. Para os Xucuru, são os fazendeiros. O cacique Chicão e outras lideranças já perderam a conta das ameaças de morte que receberam. Em março do ano passado, o clima ficou muito tenso na região, com o assassinato do advogado e procurador da Funai Geraldo Rolim, considerado um irmão pelos Xucuru. Os assassinos continuam foragidos.
No jogo dos interesses, Evandro Maciel Chacon, prefeito de Pesqueira e parente do vice-presidente Marco Maciel, juntamente com o deputado federal Roberto Magalhães (PFL/PE), "apóiam politicamente os inimigos dos Xucuru". A denúncia é feita por João Batista de Oliveira, que acompanha de perto a demarcação. Ele é integrante do Conselho Indigenista Missionário de Garanhuns/PE, o Cimi.(Paulo Lima, p. 22)


Maxacali lançam
Campanha internacional


Não pára de crescer o número de adesões à Campanha Internacional pela Regularização do Território Maxacali. Semi-nômades, caçadores e coletores, no passado os Maxacali se deslocaram por um vasto território, que se estende do sul da Bahia ao Vale do Rio Doce, entre os Estados do Espírito Santo e Minas Gerais.

Atualmente, 710 Maxacali vivem no Município de Bertópolis/MG, sob constantes ameaças, em particular nas áreas de Pradinho e Água Boa. Nos últimos anos, aumentou o número de conflitos entre indígenas e fazendeiros. Nenhum culpado de violência contra os Maxacali foi até hoje punido.

A campanha é uma iniciativa conjunta do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e do Centro de Documentação Eloy Ferreira, com o apoio da Juventude Católica da Áustria. A idéia é sensibilizar a opinião pública para exigir do governo federal a imediata regularização da área indígena e a retirada dos invasores.

Além de um abaixo-assinado circulando dentro e fora do Brasil, os organizadores estão divulgando um dossiê sobre o tema, vídeo e fotogra-fias. Quem estiver interessado em receber informações e apoiar a campanha pode escrever para:

Cimi-Leste
Rua Eurita, 516 - Santa Tereza
31010-210 Belo Horizonte, MG
Fone/Fax: (031) 461.2499.

Os Maxacali se autodenominam Tikmã-ãn, que quer dizer: "Nós, humanos". Eles conservam sua cultura e língua próprias. ( P.L.)