A paróquia de Agostinho Porto se despede com emoção de seu pastor


Apenas algumas semanas após ter celebrado 60 anos de sacerdócio, com a presença do bispo, colegas de várias paróquias e de uma comunidade emocionada, o mons. José Boggiani morreu na madrugada do dia 25 de agosto. Estava há poucos dias internado no Hospital da Beneficiência Portuguesa, por problemas circulatórios. Em outubro, ia fazer 84 anos de idade.

O corpo, velado na paróquia N. Sra. das Graças, em Agostinho Porto, na qual ele trabalhou como vigário e pastor durante 48 anos, foi levado, por desejo da família, para a sua cidadezinha natal, Vigevano, Norte da Itália. Lá agora ele descansa ao lado da mãe da qual, até o final da vida, guardou viva lembrança.

A paróquia de Agostinho Porto lhe deve muito. Foi dele a iniciativa da construção da Igreja e das estruturas paroquiais mas, principalmente, foram dele os ensinamentos que orientaram pessoas e famílias durante cinco décadas. De seu trabalho e testemunho outras comunidades surgiram: Eden, Coelho da Rocha, Vilar dos Teles e Jardim Meriti. "Hoje temos pelo menos um sinal da fé em todos os bairros", nos disse recentemente, quase que avaliando seu trabalho pioneiro na Baixada.

Do passado, uma marca permaneceu viva até os últimos dias: a de Segunda Guerra Mundial, da qual participou ao lado das tropas italianas como capelão militar. Foi experiência de uma tragédia que parecia não ter fim. Guardou a lembrança de pessoas e, principalmente, de situações como a da terrível retirada da Rússia. "Foi uma caminhada que não terminava nunca. Quanta gente morreu nos meus braços! Isso eu não posso esquecer nunca", confessou na entrevista que há pouco mais de dois meses deu ao jornal PILAR. Mas ainda mais triste que a guerra foi a experiência da ingratidão da qual se sentiu vítima quando, ainda na euforia da liberdade, foi preso, julgado e condenado a 8 anos e 4 meses de prisão, acusado de ter colaborado com os inimigos. Ficou só 1 ano e três meses no presídio de Portolongone, na Ilha d'Elba. Logo foi beneficiado por uma anistia concedida a todos os prisioneiros políticos. Mas foi uma experiência que deixou marcas profundas, principalmente no coração. Comigo lembrou longamente de um homem que mostrava um prazer especial ao maltratá-lo e humilhá-lo. Era o diretor do presídio: um ex-padre, embrutecido pela guerra. O Pe. José o lembrava com pena e tristeza, comentando: "Como a guerra pode mudar o coração das pessoas!"

Era um homem de casca dura. Lembro que um dia, naquela secretaria da paróquia onde passou os últimos anos da vida, presenciei a uma cena que me deixou, ao mesmo tempo, constrangido e comovido. Chegou uma jovem senhora, mãe solteira, pedindo para batizar o filho. Vinha de uma paróquia vizinha. Do jeito dele, o padre informou que ela não podia batizar lá, deveria participar de sua comunidade. Insistiu que de nada adianta batizar uma criança quando os pais não têm responsabilidade. A moça ficou triste. Sentiu-se chamada de irresponsável. Começou a chorar. Disse que tinha responsabilidade e que revelava isso em sua teimosia de criar o filho sozinha e de querer para ele uma educação cristã. O mons. José não conseguiu disfarçar seu embaraço. Seus olhos também ficaram molhados de lágrimas.

Era assim: duro e exigente mas atento às pessoas e a seus dramas. Havia sempre alguém procurando-o. Sabia que não sairia daquela salinha sem conseguir um trocadinho ou uma pequena ajuda qualquer.

Homem justo e servo fiel, agora descansa num pedacinho de terra que um dia ele ajudou a libertar.





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