Conselho Mundial de Igrejas |
Conferência Mundial sobre Missão e Evangelização |
PRESS RELEASE No. 3 26 de novembro de 1996
As Igrejas Cristas devem opor-se, em todas as culturas, em nome de Deus, "as pretensoes totalitarias da logica do mercado". E o que afirmou hoje de manha,a teologa alema Cornelia F?llkrug-Weitzel, em palestra na Conferencia Mundial sobre Evangelizacao e Missao que o Conselho Mundial de Igrejas (CMI) promove no Hotel Othon Palace, em Salvador (BA). Participam desse evento ecumenico, que se realiza aproximadamente a cada 10 anos, 600 delegados de 90 paises. O Conselho Mundial de Igrejas tem sede em Genebra, Suica. E integrado por 330 igrejas cristas. O tema de Cornelia Weitzel foi "Cultura e Evangelizacao para o nosso tempo". Apresentou-se, inicialmente, como uma teologa distante da "neutralidade classica" e como herdeira de uma familia ligada a chamada "Igreja Confessante", ou seja, aos setores da Igreja Crista alema que se opuseram contra o regime nazista. Um desses membros, o pastor luterano Dietrich Bonhoeffer, foi executado pelos nazistas. Nesse sentido, a teologa disse identificar-se com os movimentos cristaos pela justica, os direitos humanos e paz e como alguem que integra uma Igreja "que continua dominada pelos homens". Ao criticar a logica do mercado, afirmou, depois,que "toda alianca com os interesses do capital, com a logica e a cultura do mercado, e totalmente inconciliavel com o Evangelho, seja quando esses interesses manifestam-se em sua forma extrema, no chamado "prosperity gospel" ("evangelho da prosperidade"),seja quando se dissimulam sob uma fachada crista". Destacou que as igrejas "devem, em nome do Evangelho, formular sua recusa a toda absolutizacao e idolatria do mercado e a sua variante ideologica, o pluralismo erigido como algo absoluto". A missao da Igreja, segundo Weitzel, e a de "libertar os seres humanos da escravidao imposta pela sociedade de consumo e da mentira que pretende transformar o consumo em felicidade". Esse testemunho eclesial seria realizado atraves do "exemplo de uma vida alternativa e de uma contra-cultura da renuncia". Isto implicaria tambem em "ajudar os moradores dos paises ricos a se imporem limites, afastando-se da ideologia do crescimento ilimitado e do estilo de vida que lhe e decorrente, restituindo-lhes, assim, a visao crista de uma vida que prioriza a qualidade sobre a quantidade e oferece perspectivas e uma nova esperanca para milhoes de excluidos". Weitzel citou, a seguir, o escritor alemao David Bosch que descreve a sociedade pos-moderna como "umasociedade totalitaria, em que esse totalitarismo permanece desconhecido, porque e visto como benefico". "Em nome de seus pressupostos e derivacoes - escreve Bosch, citado pela teologa - mencionem-se a centralizacao, a burocratizacao, os atentados contra o meio ambiente, a manipulacao e a exploracao dos seres humanos, a ideologia impiedosa do consumo e o desemprego cronico. E uma sociedade permissiva, desprovida de normas, exemplos e tradicoes, que vive "o momento", sem passado e, tambem freq?entemente, sem futuro, em que as pessoas vivem unicamente no presente e buscam satisfacoes imediatas". Numa perspectiva autocritica, analisou tambem a historia das relacoes entre o Evangelho e a cultura na Alemanha, comecando por afirmar que os teologos alemaes deram mais prioridade, em sua opiniao, a critica aos esforcos de contextualizacao e inculturacao feitos na Asia,na Africa e na America Latina. Voltando-se para a realidade alema a partir dos anos 60, Weitzel refletiu sobre o que significa viver a pos-modernidade, em um contexto de Primeiro Mundo. Desde os anos 60, afirmou, diversas culturas afirmaram-se na Alemanha, em um fenomeno que "abala a sociedade industrial e todas as instituicoes tradicionais, inclusive a familia, a Igreja e os partidos. Essa mudanca "favorece um crescente individualismo e surge uma multiplicidade de culturas superpostas, como se fossem um verdadeiro supermercdo cultural em que cada individuo pode servir-se". O multiculturalismo alemao de hoje e igualmente favorecido, explicou, pela presenca de trabalhadores imigrantes, alemaes de origem vindos do Leste europeu e asilados, Para a teologa, acontece na Alemanha o mesmo que no restante do mundo:"toda expressao cultural e submetida, de modo cada vez mais claro e brutal, a dominacao da economia". Isto chega a caracterizar, para ela, uma verdadeira metacultura, baseada na "lei da mudanca constante e cada vez mais rapida" e que tambem se caracteriza pelo ideal de uma "boa vida", marcada pela ideologia do consumo, por uma materialismo desenfreado, pelo desaparecimento da solidariedade e por uma cultura narcisista. Apesar de tudo, destacou, observa-se, tanto na parte ocidental quanto na oriental (ex-comunista) da Alemanha, um renascimento do interesse pela religiao, em plena cultura pluralista pos-moderna. Mas esse novo interesse nao passa, basicamente, pelas instituicoes eclesiasticas tradicionais e se traduzem, agora,na formacao de comunidades integradas por minorias. As Igrejas historicas, observou, tem, hoje, diante dessas mudancas, mais perguntas que respostas. Uma primeira atitude, nesse contexto,a ser adotada pelas Igrejas e pelos cristaos, na avaliacao de Weitzel,e a de retomar a consciencia da soberania de Deus. Isto implica em um arrependimento pessoal e historico diante dos resultados desumanos e desumanizantes de acoes passadas e presentes, em que os poderes eclesiastico, estatal, militar e do capital privado estiveram, muitas vezes, juntos. Essa autocritica, segundo a teologa, passa pelo reconhecimento de que "a forma ocidental da fe nao tem mais significado para o resto do mundo". Outra implicacao, em termos de mudanca de atitude, e a diversificacao dos ministerios religiosos e pastorais, que nao podem limitar-se apenas aos clerigos. Mas a atitude mais importante, na visao da teologa, e a afirmacao de uma atitude de denuncia profetica, por parte das Igrejas, como instituicoes e dos homens e mulheres que se chamam cristaos, diante do que denominou como a logica totalitaria do mercado que assume hoje um papel ideologico hegemonico, no mundo cada vez mais globalizado.
O Conselho Mundial de Igrejas é uma comunidade de igrejas, atualmente 330, presentes em mais de 100 países de todos os continentes, a maioria das quais pertencentes às tradições cristãs. A Igreja Católica Romana mantém laços de cooperação com o CMI, embora não seja uma das igrejas membros. O principal organismo de direção do CMI é a Assembléia Geral, que se reúne aproximadamente a cada sete anos. O CMI foi constituído oficialmente em 1948, en Amsterdam (Holanda). O Secretário Geral do Conselho é o pastor Konrad Raiser, da Igreja Evangelica de Alemanha. |