Em defesa da Vale do Rio Doce


Barbosa Lima compara MP
a atos da ditadura

O presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), Barbosa Lima Sobrinho, considera "inaceitável" a decisão do presidente Fernando Henrique Cardoso de tentar impedir ações judiciais contra o leilão da Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) através de medida provisória. "Tal artifício lembra os atos institucionais da ditadura que V.Excia combateu", afirma Barbosa Lima na carta enviada ontem (01/04) a Fernando Henrique Cardoso solicitando uma audiência para discutir a privatização da Vale. Também assinam o pedido de audiência o presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Sérgio Ferreira; o Arcebispo de Mariana, Dom Luciano Mendes, ex-presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB); o presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Ernando Uchoa; o presidente do Clube de Engenharia, Raymundo de Oliveira; o presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros, Hermann Baeta; e o arquiteto Oscar Niemeyer.

Na carta Barbosa Lima e demais signatários questionam a venda da Vale argumentando que "o controle desse patrimônio de inestimável valor, construído pelo esforço de brasileiros ao longo de 54 anos, não pode ser alienado" por causa dos evidentes prejuízos que trará ao país. Citam, entre outros, o fato de que das dez maiores empresas exportadoras brasileiras, cinco pertencerem ao sistema Vale do Rio Doce - líder no mercado mundial de minério de ferro e maior produtor de alumínio e ouro da América Latina. Destacam também o fato de que a Companhia Vale do Rio Doce tem receita bruta anual da ordem de R$ 5,5 bilhões e aplica até 8% de seu lucro líquido em programas de alta relevância social para centenas de municípios brasileiros.

"A Vale honra a Nação Brasileira. É um conglomerado altamente lucrativo que não depende de recursos do Tesouro Nacional, formado por 54 empresas (próprias, controladas ou coligadas), quase todas de grande porte, que interagem com a agricultura, a indústria, o transporte, o comércio exterior e o sistema nacional de pesquisa científica e tecnológica", diz a carta. Alerta também para o fato de que a companhia controla concessões que somam hoje 16 milhões de hectares do território nacional, ou quatro vezes o tamanho do Estado do Rio de Janeiro, em áreas selecionadas por seu potencial mineral, sendo boa parte na Amazônia.

O documento encaminhado à Presidência da República afirma que "a Companhia Vale do Rio Doce é quem melhor conhece o nosso subsolo e lida basicamente com recursos não renováveis". Em seguida, enumera esses recursos que fatalmente passarão a ser controlados de fora do Brasil: "A Vale tem direitos minerários sobre reservas comprovadas de 41 bilhões de toneladas de minério de ferro, 994 milhões de toneladas de minério de cobre, 678 milhões de toneladas de bauxita, 67 milhões de toneladas de caulim, 72 milhões de toneladas de manganês, 70 milhões de toneladas de níquel, 122 milhões de toneladas de potássio, 9 milhões de toneladas de zinco, 1,8 milhão de toneladas de urânio, 1 milhão de toneladas de titânio, 510 mil toneladas de tungstênio, 60 mil toneladas de nióbio e 563 toneladas de ouro". A carta diz ainda que a CVRD possui e opera portos de grandes dimensões, a maior frota de navios graneleiros do mundo e 1.800 km das mais modernas ferrovias brasileiras, por onde trafegam 64% da carga transportada por trens em território brasileiro.

Em seguida, Barbosa Lima denuncia que "acumulam-se fortes indícios de irregularidades" no processo de privatização conduzido pelo BNDEs, especialmente "a grosseira subavaliação do patrimônio da CVRD" feita pela corretora norte-americana Merril Lynch. Ele garante na carta: "Investigadores independentes descobriram que essa corretora mantém relações de negócios com a mineradora sul-africana Anglo American, principal interessada na compra, o que contraria a Lei de Licitações (nš 8.666). Tais relações foram confirmadas pela nota recentemente enviada pela Merril Lynch ao BNDES, que resolveu não investigar essa ilegalidade flagrante, assumindo de pronto a defesa da empresa cujo trabalho deveria fiscalizar". Acrescenta ainda que foi sonegada pela Merril Lynch a informação da ocorrência de urânio - um minério submetido a legislação especial - nas minas descobertas no Pará pela Docegeo, empresa de pesquisas do grupo CVRD.

Ao concluir, Barbosa Lima Sobrinho e demais signatários afirmam que "a realização do leilão de venda e desnacionalização da CVRD é um ato lesivo que não encontra paralelo na história brasileira" e se isso acontecer, o Brasil estará abrindo mão "de seu mais poderoso instrumento de participação soberana" no mundo globalizado. O signatários da carta pedem a Fernando Henrique que suste imediatamente o leilão da Vale do Rio Doce "para que a sociedade brasileira possa fazer uma avaliação madura e equilibrada" do assunto.


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