Natal
Faltam nove dias...Uma terrível epidemia propagou-se entre os moradores da cidadezinha. O primeiro sintoma era uma gripe: quem pegava começava a espirrar, ficava cinzento e, depois de alguns dias, tornava-se ávido, receoso, violento e até ladrão. Os coitados eram atacados por uma vontade louca de arrumar dinheiro de qualquer jeito. Ninguém conseguia segurá-los. Advento:
tempo de espera.
UMA LUZ NA JANELA
A paixão pela grana gerou um medo danado. Todo o mundo preocupou-se em reforçar a segurança de suas casas. Alguém chegou a instalar portas com dezoito trancas. Até nas famílias a coisa ficou brava. Os pais, durante a noite, roubavam os trocados dos filhos e estes não faziam nada sem dinheiro.
A vida na cidade tornou-se insuportável. Quase todos viajavam armados e os mais ricos não saíam de casa sem escolta. Os doentes tinham cara feia e não conseguiam sorrir. As conversas eram sempre sobre dinheiro, bancos, finanças... Ninguém queria pagar os impostos. A Prefeitura estava à beira da falência.
A Câmara Municipal reuniu-se em caráter de urgência. Foram horas de discussão, mas sem encontrar solução. Quando todo o mundo estava exausto, o Prefeito teve uma brilhante idéia: procurar o Velho Sábio, um eremita que vivia no meio do mato.
O velho, acariciando a longa barba branca, disse: "Conheço a doença que propagou-se na cidade. É provocada por um vírus que se chama mão-de-vaca. É terrível: acaba com o coração, provoca obsessão pelo dinheiro e destrói a generosidade das pessoas. Pode-se evitar o contágio por um tempo praticando atos de bondade, mas para acabar com a doença existe um só remédio: a água da generosidade da Montanha-Que-Canta. Vocês têm que procurar um jovem forte e corajoso, generoso e desinteressado, disposto a realizar esta tarefa só por amor ao povo. Mas cuidado: a água da generosidade funciona só se for verdadeiramente desejada, esperada e acolhida. Ela terá efeito só se existir alguém esperando".
No dia seguinte, nas ruas da cidade apareceu um cartaz: "Procura-se jovem corajoso para tarefa arriscada".
Apresentaram-se dois mil candidatos, mas, quando ficaram sabendo que não iam ganhar nada, retiraram-se todos, menos um. Era um jovem forte e simpático, preocupado com os efeitos da doença que estava entristecendo o povo e acabando com a paz da cidade. Chamava-se José. O Prefeito explicou-lhe o que devia fazer, embora não tivesse nenhuma idéia de onde era a Montanha-Que-Canta. "Pode deixar comigo. Vou achá-la de qualquer jeito", disse o jovem disposto a tudo para salvar sua gente.
"Toda a cidade ficará esperando", prometeu o Prefeito. "Todas as noites acenderemos uma lâmpada em cada janela, assim você saberá que estamos à sua espera". José pegou a mochila, carregou algumas peças de roupa e um pouco de comida, deu um abraço nos pais e despediu-se com um grande beijo da namorada Maria, que lhe disse: "Ficarei à sua espera". Depois, se mandou.
José estava convencido de que três dias eram suficientes para chegar até a região das montanhas. Mas iludiu-se. Depois de dez dias de caminhada, as montanhas continuavam distantes. José, porém, não parou. Pensava nos pais, em Maria e nos habitantes da cidade que com certeza se lembravam dele e estavam à sua espera. E, todo dia, apesar dos pés inchados e doloridos, começava a marcha.
Passaram mais dez dias, depois dez meses. E nada.
Na cidade, as primeiras noites formavam um espetáculo muito bonito. Em cada janela brilhava uma luz. Era o sinal da esperança: todo mundo aguardava a água da generosidade. Mas, com o passar do tempo, muitas lâmpadas se apagaram. Alguns, cansados de esperar, desistiram. Outros, contagiados pela doença, se apressaram a apagar as lâmpadas para poupar dinheiro. A maior parte do povo, depois de muitos meses, balançava a cabeça e dizia: "Não conseguiu. Nunca mais vai voltar". A cada noite o número das lâmpadas diminuía. Mas José, depois de um ano, chegou às montanhas. Cansado, dirigiu-se até a cabana de um velho pastor que lhe ofereceu um copo de leite e lhe mostrou a Montanha-Que-Canta. "É muito perigosa. Difícil de subir. Parece um muro". "Não posso desistir. Eu vou conseguir subir", respondeu Josué. O velho pastor o acompanhou até os pés da montanha e despediu-se dele.
A Montanha cantava de verdade, com uma voz forte e alegre, mas era um pouco desafinada. José não perdeu tempo e começou a subir. As paredes, lisas e escorregadias, não tinham onde se apegar e o jovem machucou as mãos. Foi duro, mas depois de muito esforço José conseguiu chegar até o topo, onde viu a fonte da água da generosidade. A volta foi rápida. Tinha o coração cheio de alegria. Logo logo o povo teria recuperado a serenidade e a paz. Carregava uma garrafa da preciosa água. E além disso, já conhecia o caminho para voltar e buscar mais.
Uma noite sem lua nem estrelas, Josué chegou à cidade. Parou para olhar, mas aquela visão o encheu de tristeza. A cidade estava imersa na escuridão. Não havia lâmpadas nas janelas. Ninguém ficara à sua espera. "Foi tudo inútil, se ninguém me esperou".
Começou a descer com muita tristeza. Tinha vontade de jogar a água fora. Estava para fazer isso, quando de longe viu uma luz. Uma pequena lâmpada brilhava na noite escura. "Alguém me esperou", disse José dando uma grande gargalhada e começou a correr. Reconheceu a janela da casa. No fundo do coração nunca tinha duvidado. Bateu palmas com força e chamou: "Maria!" Os dois se abraçaram. "Sabia que você voltaria", disse Maria. "Por isso fiquei todo esse tempo à sua espera!"
Bruno Ferrero
A LANTERNA
Um dia, Madre Teresa de Calcutá foi visitar um pobre que vivia num barraco sujo e escuro.
"Posso limpar?", perguntou.
"Não precisa, estou bem assim!", respondeu o coitado.
"Mas, com uma boa limpeza, vai ficar melhor", insistiu Madre Teresa. E, num canto, viu uma velha lanterna cheia de poeira.
"Você nunca acende esta lanterna?"
"E para quem? Há anos que não entra ninguém em meu barraco!"
"E se a gente voltasse sempre, você acenderia esta lanterna?"
O homem não respondeu. Madre Teresa pediu a um grupo de irmãs que fossem lá toda semana. Três anos depois, as irmãs, encontrando Madre Teresa, lhe disseram: "Aquele homem quer que você saiba que desde aquele dia a lanterna ficou sempre acesa."
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Colaboração da:
Biblioteca Comboniana Afro-brasileira E-mail: comboni@ongba.org.br |