Freio na caminhada
A decisão de Roma chega num momento delicado para as comunidades católicas da Ásia. Ao atingir um dos seus melhores teólogos e assessor de bispos, parece querer redirecionar não apenas a teologia, mas também os rumos da pastoral no continente.
Não é de hoje que as posições de alguns teólogos asiáticos têm suscitado preocupações em Roma, principalmente no que diz respeito ao diálogo com as outras religiões. Na busca de novos caminhos, esses teólogos sentem o difícil desafio de conciliar as afirmações sobre a necessidade da Igreja e a proposta universal de salvação em Cristo com a sabedoria, a cultura e a fé de tantos fiéis não-cristãos.
Outro campo de preocupações diz respeito à atuação da Igreja diante da pobreza e das graves injustiças sociais no continente, o que fez nascer uma teologia e uma pastoral da libertação asiáticas. Não são poucas as comunidades e os teólogos convencidos de que o anúncio da salvação em Cristo não pode estar desligado da luta por justiça e da solidariedade para com os mais pobres. "Uma Igreja pobre e ao lado dos pobres - chegaram a afirmar - é a única chance de credibilidade que temos. Os povos asiáticos não vão acreditar em nenhuma outra verdade."
Já em sua primeira obra - "Jesus Cristo e a libertação humana" -, lançada em 1976, Balasuriya se ocupa com esses problemas. No seu último livro, tenta dar um passo à frente, ao abordar outra questão polêmica: a discriminação das mulheres e a necessidade de repensar o seu papel na Igreja. Faz isso refletindo sobre Maria, apresentada como mulher companheira e humilde, defensora do amor de Deus pelos mais pobres. Nada da figura tradicional de Maria como soberana revestida de glória, às vezes alheia aos conflitos e injustiças sociais.
Numa só obra, três novos caminhos pastorais: diálogo intercultural e inter-religioso, justiça social e solidariedade com as mulheres. São temas pouco simpáticos aos setores mais conservadores da Igreja. Na Ásia, porém - em países onde a Igreja católica sente o peso de sua fragilidade frente aos enormes desafios que se impõem -, a discussão desses temas tem sido vista como promissora, porque abre novos campos para a ação evangelizadora e missionária da Igreja.
Isso talvez explique por que a condenação romana tem sido considerada tão grave pelos setores católicos mais abertos. E também a estranheza do mesmo Balasuriya, que, numa nota de esclarecimento e defesa, afirma: "Muitos outros escritores, especialmente no Ocidente, expressaram opiniões semelhantes ou idênticas às minhas. Nenhum deles, que se saiba, foi tratado tão severamente e com a ameaça de excomunhão automática, sem provas. Por que eu me tornei vítima de uma única e exclusiva discriminação, contra as normas canônicas da eqüidade? Acaso, usa-se um critério diferente para os teólogos asiáticos?". - H.F.
|