A Igreja no Brasil aberta ao mundo
Bíblia
"Meu coração
não é ambicioso!"
Breve comentário do Salmo 131.
Frei Carlos Mesters
PRIMEIRA TRADUÇÃO
1 Javé, meu coração não é ambicioso,
nem meus olhos altaneiros.
Não ando atrás de grandezas,
nem de maravilhas que me ultrapassam.
2 Não! Eu fiz calar e repousar os meus desejos,
como criança desmamada no colo de sua mãe.
3 Israel, coloque a esperança em Javé,
desde agora e para sempre!
SEGUNDA TRADUÇÃO
1 Meu coração não é ambicioso, Senhor,
meus olhos não enxergam mais do que podem.
Não freqüento a alta roda,
não tenho pretensões grandiosas.
2 Dentro de mim, tudo se aquietou,
paz e serenidade vieram para ficar.
Igual à criança que depois de mamar
dorme tranqüila no colo da mãe.
3 Minha gente, que Deus nos ajude
a esperar nele, hoje e sempre!
O Salmo 131 é bem pequeno. Um pensamento só, tirado da vida. Mas reflete uma sabedoria muito profunda, adquirida ao longo dos anos, de alguém - homem ou mulher - que, pelo sofrimento e pela experiência, foi amadurecendo na vida.
Alguém que já teve a tentação de procurar o sentido da vida em realizações grandiosas, na vontade de pertencer à classe nobre, na ambição de grandes projetos, mas que chegou a perceber a relatividade dessas coisas.
Para ele, agora, tudo que há de realmente bom na vida, mesmo sendo fruto de muita luta, ele o recebe, como que de graça, da vida, de Deus.
Alguém cujo olhar foi purificado pela fé e pela provação e que, agora, é capaz de perceber a grandeza e o poder de Deus nas coisas mais comuns e mais frágeis da vida. Como, por exemplo, numa criança que dorme tranqüila no colo da mãe.
Apresentamos duas traduções. A primeira é da Bíblia Pastoral. Tradução bonita e fiel, feita numa linguagem acessível. A outra, uma adaptação, procura recriar hoje em nós, através da linguagem, o que o salmo queria suscitar na mente do povo daquele tempo. As duas traduções podem ajudar a gente a descobrir melhor o sentido do que está escrito.
Meu coração não é ambicioso, Senhor,
meus olhos não enxergam mais do que podem.
Não freqüento a alta roda,
não tenho pretensões grandiosas.
São quatro frases que, com palavras diferentes, repetem a mesma coisa. Elas comunicam a experiência nova de Deus e da vida no coração de quem fez o salmo. O salmista escolheu a forma negativa para se expressar: quatro vezes um forte não!
Por detrás da escolha dessa forma negativa, existe a experiência de alguém que lutou e que agora define pelo não aquilo que conquistou. Lutou contra o orgulho e a ambição, contra a pretensão e a mania de grandeza, e conseguiu se fixar no chão real da vida, onde, após muita luta, encontrou a fonte de uma paz que parece definitiva.
Não! Eu fiz calar e repousar os meus desejos,
como criança desmamada no colo de sua mãe.
Ou, como diz a outra tradução:
Dentro de mim, tudo se aquietou,
paz e serenidade vieram para ficar.
Igual à criança que depois de mamar
dorme tranqüila no colo da mãe.
Esta comparação, tão bonita, da criança desmamada no colo da mãe permite duas interpretações.
A primeira - a mais provável - é de que se trata de uma criança de 1 ou 2 anos de idade que, conforme o costume da época, foi sendo desmamada aos poucos. Agora, ela já não sente mais o desejo de sugar o leite do peito da mãe.
Custa para uma criança aprender a se acostumar. Leva tempo. É todo um processo lento, uma aprendizagem demorada, até que o desejo se aquiete dentro dela e que a mãe possa dar o colo, perto do peito, sem o risco de suscitar na criança o desejo de mamar de novo.
A outra interpretação, que transparece na segunda tradução, refere-se à criança que mamou e que agora, por isso, está quieta e satisfeita, dormindo no colo da mãe.
Qualquer que seja a interpretação, a imagem do relacionamento da criança com a mãe serve para expressar o relacionamento do salmista com Deus. A comparação usada sugere um misto de paz e tranqüilidade, entrega e confiança, como fruto de luta e de conquista.
O salmo termina com uma exortação:
Israel, coloque a esperança em Javé,
desde agora e para sempre!
O que o/a salmista viveu e experimentou ao longo dos anos de sua vida é uma coisa tão boa que ele/a deseja que todos, um dia, possam chegar a participar da mesma experiência.
Como já verificamos anteriormente nos outros Salmos de Romaria, a experiência de Deus não fecha a pessoa em si mesma, mas a abre para a comunidade, para o povo. O que ela viveu e experimentou de Deus e da vida torna-se Boa Notícia levada aos outros, para que possam ter todos a mesma paz.
_____________________
Frei Carlos Mesters é biblista, autor de diversos livros. Há anos acompanha a caminhada das comunidades eclesiais do Brasil. Atualmente, trabalha no Instituto Bíblico de Angra dos Reis/RJ.
Reprodução livre, desde que citadas a fonte e a autoria
(envie um exemplar/justificativa para a revista).
Para maiores informações, ou para receber os textos completos,
faça contato com:
Revista Sem Fronteiras
Cx. P. 55 - CEP 06751-970 Taboão da Serra, SP (Brasil)
Fone: (011) 843.1221 e Fax (011) 842.1093
E-mail: camsp@mandic.com.br
Colaboração da: