Para entender os conflitos
Tudo parecia correr bem para o México na data escolhida para seu ingresso no Nafta, o Tratado de Livre-Comércio com os Estados Unidos e o Canadá: 1º de janeiro de 1994.
Nessa mesma data, porém, aconteceu o que o governo menos desejava: o levantamento indígena no estado de Chiapas, o mais pobre do país.
Não se pode dizer que Salinas, o então presidente, não esperasse pela revolta. Sinais havia, mas o México oficial, embalado pelo sonho do Primeiro Mundo, resolveu não levar a sério.
As imagens dos rebeldes do Exército Zapatista de Libertação Nacional percorreram o mundo. Cansados de séculos de opressão e desprezo, os indígenas pegaram em armas para exigir mudanças, não só para si mas para o país.
Foi o primeiro grande choque para o PRI, o Partido Revolucionário Institucional, no controle do governo e das principais instituições do país há quase sete décadas - é o único partido do mundo que ficou tanto tempo no poder neste século.
O outro grande choque ocorreria em dezembro do mesmo ano de 1994: a derrocada da economia, afundando o México no caos e assustando os países que optaram pelo modelo neoliberal, incluindo o Brasil (o famoso "efeito tequila").
Assim que estourou a rebelião, as tropas do exército mexicano invadiram imediatamente a região de Chiapas, perseguindo os rebeldes e, no processo, também a população civil. Sobrou também para a Igreja católica em San Cristóbal de Las Casas, a diocese do bispo Samuel Ruiz, conhecida por seu trabalho pastoral de cunho popular.
Fazendeiros, políticos do PRI, soldados e policiais se articulam na caça às bruxas. Oficialmente, fala-se em diálogo de paz. Na prática, segue valendo a lei do fuzil. Incapaz de reconhecer as verdadeiras causas do conflito - a marginalização, a opressão e a miséria -, o governo tem tentado, até agora sem sucesso, derrotar a resistência indígena na base da força.
O domínio absoluto do PRI sobre um país em frangalhos - com altas taxas de desemprego e uma economia em petição de miséria - começou a ser quebrado no início de julho passado, nas eleições para o Congresso e o governo do Distrito Federal.
A vitória avassaladora do oposicionista Cauhtémoc Cárdenas, do PRD (Partido da Revolução Democrática), eleito governador do Distrito Federal, e a perda da maioria na Câmara Federal representaram o mais duro golpe político na história do PRI, um partido autoritário e corrupto.
"Assistimos a uma rebelião desarmada", pelo voto, disse o cientista Lorenzo Meyer, do Colégio do México, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo. Nas primeiras eleições livres do século, o 7 de julho, segundo os mais otimistas, ficará para a história como o dia do fim do regime do PRI.
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