Peul

Beleza é fundamental

Somam cerca de 12 milhões, partilham a mesma língua e cultura e habitam vários países africanos, desde o Senegal, na costa oeste, até o Chade, no centro do continente. Para os Peul, principalmente para o grupo dos Bororo, beleza física não é coisa de se desprezar.


Nômades, ao longo dos séculos os Peul se espalharam por toda a região a oeste do Saara, desde o Senegal até o Chade. O número deles chega a mais ou menos 12 milhões. Estimativamente, são 8 milhões na Nigéria, 1 milhão no Senegal, 700 mil no Níger e 600 mil no Mali.

Falam uma língua semi-bantu, o fulfulde e preferem ser chamados de fulbé ou pulaar. Mas também são conhecidos por outros nomes, como fula, fulani, fellata.

Ninguém sabe dizer ao certo de onde vêm. A hipótese de que sejam descendentes dos antigos habitantes do norte do Egito nunca foi comprovada. Há quem os considere parentes dos etíopes.

O certo é que os Peul, numa época remota, vieram de algum lugar do nordeste africano e chegaram à vasta região onde hoje vivem pela bacia do Rio Senegal. Ali, entre os séculos nono e quatorze, se consolidou o reino de Tekrur, dominado pelos Tukuleur. Estes se converteram ao islamismo por volta do ano 1000.

No século quinze, um outro reino peul formou-se em Mopti (atual Mali), e um terceiro, nos séculos posteriores, na região montanhosa de Futa-Djallon (Guiné).

No final do século dezessete, grupos de pastores peul emigraram na direção leste, e, em 1810, fundaram o pequeno reino de Liptako. Outros, ainda, chegaram até Gobir (no atual Níger), um dos sete reinos da etnia haussá.

Todo esse movimento migratório e expansionista se deve ao fato de que os Peul, dedicados ao pastoreio, se deslocavam continuamente de um lugar para outro em busca de pastagens para os rebanhos.

Nesse vaivém, foram muitos os contatos com populações de vida sedentária, incluindo matrimônios. Mas sempre conservaram a língua e os costumes próprios.


GRUPOS DIFERENTES
DE UM MESMO POVO

Os Peul são profundos conhecedores da natureza e dos seus ciclos. Normalmente, os casamentos são monogâmicos, mas a poligamia não é proibida, dependendo apenas do poder econômico da pessoa.

O que no passado fazia dos Peul um único povo era a criação de vacas, camelos e cabras. Ao longo dos séculos, porém, foram surgindo grupos diferenciados, com vida social mais ou menos distinta. Quatro são os grupos fundamentais.

No século passado, graças ao poder conquistado, o clã toorobe optou pela vida sedentária, adquirindo bens e escravos, aos quais confiavam o cuidado dos seus rebanhos. Desse modo veio se constituindo uma burguesia peul que, pouco a pouco, afastou os Haussá dos centros de poder. Riqueza, educação, vida sedentária e vínculos sempre mais estreitos com a vida urbana moderna acabaram levando os Toorobe a perder as raízes nômades.

Por diversas razões, também os Peul do grupo fulbé se sedentarizaram, sendo hoje conhecidos como "os Peul da cidade".

Os outros dois grupos ainda seguem com o pastoreio e a vida nômade. São os "Peul das vacas" (ou "Peul do monte") e os Peul bororo.

Mais conhecidos, os Bororo são os que, culturalmente, identificam todos os Peul. Nunca abandonaram o nomadismo, nem abraçaram o islamismo como os outros grupos.

Fiéis aos costumes ancestrais, são muitas vezes considerados pelos outros um povo de costumes primitivos e pagãos. Muito já se escreveu sobre esse grupo étnico, que proíbe a mestiçagem e professa um autêntico culto à beleza.


BELEZA FÍSICA,
GADO E FAMÍLIA

Três coisas dão sentido à vida dos Bororo: beleza física, gado e família.

A condição social é determinada pelo número de animais que criam nos limites entre a savana e o deserto. É muito forte a ligação com o rebanho. Os meninos começam a pastorear cedo, assim que conseguem ficar de pé, enquanto as meninas, ainda bem pequenas, aprendem a fazer queijo.

O ritmo das estações determina a vida social. Durante a estação das chuvas (entre julho e setembro), os Bororo se reúnem em grupos para buscar as melhores pastagens.

Na estação da seca, cada família cuida independentemente do próprio gado, cava poços e faz compras nos mercados distantes. É sem dúvida também a temporada dos amores, dos bailes e das festas. A festa mais importante é a do yakeol, que prepara a eleição do togu, o jovem mais bonito.

Praticamente autônomos em termos de subsistência, conseguiriam sobreviver num território completamente despovoado, com a única condição de poder dispor de pastagens para os seus rebanhos de vacas, camelos e cabras.

O mesmo não se pode dizer dos outros grupos Peul, que sobrevivem graças às trocas comerciais: leite por hortaliças e cereais, ou pastagens em troca do adubo natural dos seus animais.

A típica cabana peul é redonda e em forma de cone. Uma estrutura de madeira é recoberta de palhas que chegam a tocar o chão.

Os Peul são amantes das cores suaves e dos materiais transparentes. Como enfeites, usam de preferência âmbar, jaspe, cristal, ágata e ouro. Ornamentos em ouro e âmbar sobre a cabeça são símbolos de encanto e prestígio.

Como todos os povos nômades, os Peul desenvolveram mais a cultura oral que as artes plásticas. A música e a dança ocupam um lugar de destaque. A poesia é bastante desenvolvida e - não é estranho - de caráter bucólico.

Existe um importante patrimônio literário peul, com poemas religiosos e épicos que exaltam a misericórdia de Alá. Outros cantam a beleza da mulher ou da vaca. Eis um exemplo:

"Ó vacas minhas! Vacas ligeiras, espalhadas ou reunidas nas encostas das colinas ou no alto dos montes! Vocês sobem e descem, pastam e se fartam de ervas frescas, erva de primavera e de outono, pequena ou grande, que brota perto do fogo ou nos largos prados, ervas já crescidas como caniços aptos para virar flautas". - COM INFORMAÇÕES DE MANAHIRO ETIENNE


Concurso
de beleza masculina


A festa bororo do gerewol e do yakeol é celebrada todo ano, quanto termina a estação das chuvas, entre o final de setembro e o final de outubro. Chega a reunir até mil pessoas e dela podem participar os membros de qualquer um dos sete clãs bororos. O clã que organiza o evento deve cuidar para que todos os visitantes encontrem comida e um lugar onde montar suas tendas.

Os jovens se preparam para a dança pintando o rosto com linhas de cor amarelo-ocre e branca para ressaltar suas feições agudas. Na cabeça, levam um turbante ou um gorro da etnia peul. Dos ombros lhes cai uma longa peça de tecido de várias cores. Calçam sandálias de couro ou de borracha.

É esse o uniforme para a primeira dança, o gerewol, que dá nome à festa e que começa na parte da manhã. Dispostos em filas, os jovens dão-se as mãos e as levantam ritmicamente, alçando-se sobre as pontas dos pés. Abrem os lábios, deixando os dentes bem à vista, e giram a pupila para mostrar o branco dos olhos. É que, para os Bororo, a beleza está associada à cor branca.

Todos os rapazes de 15 a 30 anos, casados ou não, com ou sem filhos, podem participar dessa dança. O adulto só deixa de participar quando o filho mais velho se junta pela primeira vez ao grupo dos dançadores.

O público é formado principalmente por moças e mulheres. Alguns anciãos movem-se entre o público e os dançadores para pôr ordem na dança.

Ao pôr-do-sol, os mesmos jovens que dançaram o gerewol se entregam à dança do yakeol. Têm a face brilhante, com pinturas de tonalidades ainda mais brancas. Levam plumas de avestruz na cabeça, chocalhos nos tornozelos e pequenas tochas na mão. Um grito profundo sai da sua garganta, enquanto, dispostos em fila, fazem soar os chocalhos.

Se pela manhã dançavam exaltando a própria beleza, agora é algo diferente o que parecem manifestar: espírito de grupo, ritmo, força. Dançam uma dança de guerra que celebra uma vitória.

Ao amanhecer do dia seguinte, acontece uma terceira dança. Nesse momento, as jovens participam em maior número e mais animadamente. Com muita discrição, elegem o togu, o jovem mais belo. De repente, um grupo delas se separa do público e rodeia rapidamente o jovem escolhido.

Logo volta a calma. O jovem togu se distancia, acompanhado pelos anciãos, que o cumprimentam. Além de belo, o togu deve ser uma pessoa nobre, pacífica e animada por um imperturbável sentido de dignidade. Enfim, um homem que merece ser escolhido como marido.