Egito

Maria, Maria

Deixou marido e filhos na Índia para trabalhar no Egito. Foi escravizada.


Alberto Eisman, do Egito

"Uma mulher que merece
viver e amar como outra
qualquer do planeta."
Milton Nascimento

Quando o sacristão abriu o portão da igreja, levou um susto de todo tamanho: umas peças de roupa escondiam um corpo deitado no chão, entre um automóvel e a calçada.

Era o de uma mulher ainda jovem. Pelas mãos, dava para adivinhar que se tratava de alguém acostumado a pegar no pesado. Mal conseguia andar, um dos pés estava muito inchado, gemia de dor.

Assim que conseguiu se recompor, balbuciou o próprio nome num inglês rudimentar e tentou explicar por que estava ali, daquele jeito, no meio da rua.


Sonho e realidade – Chamava-se Maria e chegara da Índia fazia uns sete meses. A proposta tinha sido tentadora: uma passagem de avião e garantia de trabalho na casa de uma família egípcia.

O que mais se poderia exigir? Certo que era duro demais ter que se separar por um tempo do marido e dos três filhos, mas valeria a pena, ela pensava: o que não faz uma mãe para dar de comer aos próprios filhos?

Não precisou mais de um mês para a aventura se transformar numa verdadeira desgraça: os novos "amos" egípcios ficavam impacientes com ela, reclamavam de tudo, ameaçavam. Se a criança de quem tomava conta resolvia chorar, sobrava para ela.

Foi só o começo. Nos seis longos meses seguintes, teve que se submeter a violências e humilhações dignas de um campo de concentração. Apanhava da "senhora".

Perguntamos quem tinha sido, como se chamava a família, onde ficava a casa... A todas as perguntas, Maria respondeu com um desolado "não sei".

Não estava mentindo. Durante sete meses, a única coisa que pôde ver e conhecer foi o lugar da casa onde trabalhava.


Fuga pela janela – Quando chegou ao Egito, ouviu um conselho de uma compatriota que tinha vindo antes dela: "Se estiver na pior ou for maltratada, procure a igreja, porque lá você encontrará ajuda".

Maria jamais imaginou que precisasse chegar a esse ponto. Até que não teve mais jeito.

Aproveitou um momento em que se encontrava sozinha e tentou escapar pela porta. Estava trancada a chave. Então, abriu a janela e desceu do quinto andar, apoiando-se no cabo de uma antena parabólica.

Teve sorte. O cabo não se rompeu, mas isso não evitou um tombo de alguns metros de altura. Machucou o pé.

Andando como podia, parou o primeiro taxi que passava pela rua, deu ao taxista o dinheiro que tinha e suplicou: "Para a igreja!".

Veio parar na nossa igreja e, tendo encontrado a porta já fechada, resolveu esperar que abrissem. Pegou no sono e ali mesmo passou a noite.


Muitas Marias – Felizmente, o longo e trágico pesadelo de Maria terminou. Um grupo de religiosas a acolheu e providenciou para ela a passagem de volta à Índia.

É possível que nada aconteça à família para a qual trabalhou, como nada acontece a muitas outras que, neste e em outros países, fazem o mesmo. Abusam de uma legião de moças e mulheres que deixam a pátria com o único sonho de buscar um futuro melhor. Abusam e escravizam, no sentido mais literal da palavra.

São centenas e milhares de tailandesas, filipinas, indianas, eritréias e outras, obrigadas a encarar uma realidade de abusos psíquicos e físicos de toda ordem. Por desgraça, isso acontece com mais freqüência em países árabes.


Palavra de Deus – Oficialmente, a escravidão desapareceu, e não há ninguém a condenar. Na realidade, porém, às portas do ano 2000, ainda não se produziu aquele tipo de abolição de fato, que todas as pessoas de bem anseiam.

Já não existem mais correntes, barcos negreiros ou chicotes. Mas continuam, sim, existindo mercados de escravos, que são fonte de opressão, violência e exploração.

É exatamente em situações como essas, neste nosso mundo de hoje, que a Palavra de Deus adquire uma atualidade impressionante:

"Este é o jejum que me agrada: romper os grilhões da iniqüidade, soltar as ataduras do jugo, libertar os oprimidos e pôr um fim em toda escravidão" (Isaías 58,6).


O país

Nome oficial: República Árabe do Egito
Capital: Cairo
Nacionalidade: egípcia
Idioma: árabe (oficial), inglês, francês
Localização: nordeste da África
População: 64,2 milhões (1996)
Religião: islamismo (sunitas) 90%, cristianismo 10% (1990)


FUGA PARA O EGITO
Nome: Maria
Origem: Índia
Profissão: "do lar"
Estado civil: casada,
três filhos
Situação particular: deixa a pátria, fugindo da pobreza, para trabalhar como empregada doméstica no Egito, onde é escravizada.
Nome: Maria
Origem: Belém da Judéia
Profissão: "do lar"
Estado civil: casada,
um filho
Situação particular: foge com o marido José e o filho Jesus para o Egito, porque Herodes quer matar a criança.