Povos Indígenas

Passou da hora

Cimi reforça cobrança de novo Estatuto indígena.


Colaborou: Kátia Vasco, do Cimi
cimi@embratel.net.br


"Novo Estatuto: direito dos povos indígenas." Este é o tema da Semana dos Povos Indígenas 98, de 13 a 19 de abril, promovida pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi), um organismo ligado aos bispos católicos do Brasil.

O tema foi escolhido porque é urgente "a aprovação de uma legislação, que assegure o respeito aos direitos desses povos", direitos esses "garantidos na Constituição Federal de 1988".

O Cimi acredita que a legislação especial "estabelecerá as bases para romper com a relação etnocêntrica e genocida das atuais políticas e práticas indigenistas".


Herança colonial – A invasão do território, em 1500, trouxe desgraça à vontade para os povos que há mais de 40 mil anos ocupavam as terras disso que depois ganhou o nome de Brasil.

E quando o Estado brasileiro, já neste século, tentou legislar sobre a situação dos sobreviventes do longo extermínio, saiu-se muito mal. Ficou valendo a idéia de que índio bom é índio integrado. Essa postura serve de base para a lei número 6.001, de 19 de dezembro de 1973, que dispõe sobre o Estatuto do Índio.

O Cimi explica, no texto-base para a Semana: "A lei em questão se propõe a 'preservar' a cultura" dos "índios ou silvícolas", "comunidades indígenas" ou "grupos tribais", como são chamados os povos indígenas. Mas, ao mesmo tempo, quer integrá-los à "comunhão nacional". É o objetivo maior.


Avanços – "A Constituição de 1988 marca uma ruptura", diz o Cimi. Entre outros aspectos, "reconhece a existência e a importância da diversidade étnica e cultural dos povos indígenas".

Também "fixa o direito a permanecerem enquanto tais, conforme suas próprias formas de organização social, e garante seus espaços territoriais tradicionais".

O avanço é significativo, mas existem ainda muitos aspectos que precisam ser disciplinados pelo Congresso Nacional através de legislação ordinária, ou seja, um Estatuto.

De novo o Cimi: "É preciso pôr fim à relação preconceituosa, etnocêntrica e genocida, peculiar do indigenismo vigente. O Estatuto do Índio de 1973 está defasado e não responde mais às demandas dos povos indígenas".


Governo barra – São três os projetos de lei para um novo Estatuto que, desde 1991, tramitam no Congresso Nacional: do próprio governo federal, do Cimi e do Núcleo de Direitos Indígenas.

Em 1994, a Comissão Especial da Câmara encarregada de analisar a matéria aprovou Substitutivo do deputado Luciano Pizzato (PFL/PR), intitulado "Estatuto das Sociedades Indígenas".

De lá para cá, nada aconteceu. Segundo o Cimi, uma manobra do presidente Fernando Henrique Cardoso, às vésperas de sua posse, impediu a tramitação do Substitutivo:

"Um requerimento de votação da matéria em plenário, assinado pelo então líder do governo, deputado Arthur da Távola (PSDB/RJ), conseguiu bloquear a tramitação do projeto. Até hoje, o requerimento não foi votado, e não há qualquer demonstração de interesse do próprio governo e de sua bancada em incluí-lo na pauta".

A falta de um Estatuto cria dificuldades de todo tipo na interpretação e aplicação dos princípios constitucionais – reclama o Cimi.

Por exemplo: "Deixa a política indigenista e o tratamento de matérias importantes como a sistemática de demarcação de terras ainda à mercê de interesses anti-indígenas".


De onde vem

A Semana dos Povos Indígenas é promovida pelo Cimi há dezesseis anos, sempre em abril, que é o mês do Dia Nacional do Índio (dia 19). Só que o Cimi, além de não celebrar apenas um dia, também não fala de "índio", e sim de "povos indígenas". A diferença é grande. Povo é também cultura, história, tradições, identidades...
A Semana dos Povos Indígenas foi criada por iniciativa da Comissão Episcopal de Pastoral (CEP) da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). A idéia foi do então presidente da entidade, Luciano Mendes de Almeida, hoje bispo de Mariana/MG.
Tomando como base a experiência da Campanha da Fraternidade, o objetivo é de, uma vez por ano, ter um tempo dedicado especialmente à reflexão e ao debate sobre a realidade dos povos indígenas. O Cimi é o encarregado de escolher o tema.


Do texto-base

"É fundamental e urgente que o Congresso Nacional finalize a tramitação e aprove o novo Estatuto dos povos indígenas. As comunidades, povos e organizações indígenas, dando um exemplo de cidadania para todo o país, cumpriram com seu papel de debater, elaborar, sistematizar e apresentar suas propostas aos deputados e senadores.
Por sua vez, os parlamentares vêm dando exemplo de irresponsabilidade, desprezo e discriminação ao não encaminharem a contribuição daqueles que são diretamente afetados pelo novo Estatuto.
É necessário, neste momento, somar esforços com os povos indígenas e realizar uma forte pressão sobre o Congresso, para que este se coloque à altura do que eles e a sociedade brasileira esperam, aprovando o novo Estatuto.
Devemos cobrar dos parlamentares que retirem dos seus arquivos o 'Estatuto das Sociedades Indígenas' e o conjunto de propostas elaboradas pelas próprias comunidades, lideranças e organizações indígenas.
Continuar a evitar este debate é servir de aliado das grandes mineradoras, dos garimpeiros, dos madeireiros e fazendeiros, principais inimigos dos povos indígenas."