Nos dias 22 a 25 de maio de 1997, em Feira de Santana - Ba, estivemos reunidos, a convite da CNBB, na I Semana Social da Bahia, agentes de pastoral, padres, pastores, religiosas, bispos, sindicalistas, lideranças comunitárias, profissionais liberais, deputados, prefeitos, vereadores, num total de 419 representantes das 22 dioceses do Regional Nordeste 3 - Bahia e Sergipe. Esta iniciativa está articulada com a 3ª Semana Social Brasileira e o Projeto Rumo ao Novo Milênio.
Os debates se deram em torno das dívidas sociais, entendidas como toda privação dos diferentes bens econômicos, sociais, políticos, culturais e ambientais, socialmente produzidos. São dívidas contraídas ao longo da história e agravadas com a atual política neo-liberal. Na Bahia, mais da metade (50,9%) da população é pobre, miserável ou indigente.
Procuramos descobrir quais os possíveis caminhos de superação e resgate destas dívidas. Assim, na perspectiva bíblica do ano jubilar, queremos atualizar o perdão de todas as dívidas, restaurando o projeto inicial de Deus.
Dividas sociais na Bahia
O povo da Bahia tem uma grande dívida social e histórica a cobrar, por ser excluído dos bens essenciais para uma vida digna. Devedores são todos os que se beneficiaram da concentração da terra, da renda, das oportunidades e das decisões políticas, muitas vezes à custa de corrupção e sob o manto da impunidade, freqüentemente acobertada com a conivência do Judiciário.
Na questão da terra, a dívida com os lavradores, sem-terra, assalariados rurais, indígenas, remanescentes de quilombos e pescadores, consiste em terem sido violentamente impedidos do acesso à terra e à água suficientes e às condições dignas de vida e trabalho.
Na educação, as principais dívidas sociais se referem a uma escola cada vez mais insuficiente e precária, que não valoriza os trabalhadores do setor e a qualidade do ensino, é autoritária no processo pedagógico e na gestão e muitas vezes manipulada politicamente.
Na saúde, a dívida se traduz pela ausência de uma política orientada para as necessidades coletivas. A falta de investimentos públicos e as práticas clientelistas inviabilizam programas de prevenção e preservação da saúde, com participação e controle social.
Nos meios de comunicação, quase sempre monopolizados e controlados por poucos grupos, impõem-se muitas vezes idéias e necessidades falsas, desrespeitando a identidade sócio-cultural e moral das famílias e comunidades baianas.
Desafios para o resgate das dívidas sociais
Diante das dívidas sociais identificadas, a I Semana Social da Bahia apontou como desafios principais para resgatá-las:
- Articular as forças vivas da sociedade para superar a exclusão social, priorizando a pessoa humana e favorecendo a participação e a solidariedade;
- Mobilizar toda a sociedade por uma reforma agrário-agricola e urbana que contemple as reais necessidades e características das populações, com especial atenção às famílias que estão em ocupações, acampamentos, assentamentos e na região do semi-árido;
- Favorecer uma educação libertadora por meio da democratização do acesso e da gestão da escola e pela melhoria da qualidade do ensino;
- Criar nos municípios canais de participação para assegurar, controlar e fiscalizar os recursos destinados à saúde;
- Recuperar a função social dos meios de comunicação, democratizando o controle da propriedade e da informação.
Propostas
Para o resgate das dívidas sociais com o povo baiano, a I Semana Social propõe às comunidades cristãs e a todos os setores sociais:
- Viabilizar políticas de repartição da terra e da renda que possibilitem a superação da exclusão social;
- Garantir o acesso à terra, através de uma autêntica reforma agrária, que contemple as necessidades do povo do campo e implantar uma política geradora de emprego;
- Qualificar e valorizar o professor, democratizar a escola e exigir a aplicação transparente das verbas destinadas à educação;
- Incentivar e assegurar a implantação e funcionamento dos Conselhos Municipais de Saúde, a fim de garantir e fiscalizar os recursos destinados ao setor;
- Formar e capacitar agentes de comunicação que possam atuar eficazmente nos meios de comunicação.
Compromissos
De nossa parte, assumimos os seguintes compromissos para realizar estas propostas:
- Promover seminários e semanas sociais diocesanas, paroquiais e locais, em parcerias com movimentos, entidades e outras igrejas;
- Estar presente e apoiar as diversas formas de luta pela terra e assumir as propostas concretas de geração de emprego e renda;
- Incentivar a organização e articulação dos trabalhadores na educação e os mecanismos de democratização da escola;
- Valorizar e incentivar iniciativas de saúde alternativa, em especial as Pastorais da Saúde e da Criança, e capacitar lideranças para os Conselhos Municipais;
- Criar a Pastoral da Comunicação e que as paroquias e dioceses façam investimentos para adquirir os equipamentos e materiais necessários;
- Apoiar a instalação da Comissão Parlamentar de Inquérito para apurar as denuncias de compra e venda de votos, no processo de votação da emenda da reeleição.
Queremos dizer a vocês que fomos fraternal e calorosamente acolhidos pelo povo de Feira de Santana, em especial pela Diocese, Universidade Estadual e pela Prefeitura Municipal.
Este foi um fator importante para que os trabalhos fossem proveitosos e eficazes.
Recebemos como sopro do Espirito Santo a memória da comunidade de Canudos, há 100 anos massacrada, o reconhecimento da dívida histórica com os negros e índios e o apelo para a retomada da dimensão profética da igreja, tão necessária nos tempos atuais.
No grave momento histórico que vivemos, no limiar do terceiro milênio, a humanidade se vê numa situação semelhante a descrita pela Bíblia em Deuteronômio 30,19: "Coloco diante de ti a vida e a morte, a bênção e a maldição. Escolhe a vida e então viverás com a tua posteridade." Nós cristãos, seguindo os passos de Jesus, fazemos nossa opção pela vida e vida em abundância, com Justiça e Solidariedade.
Feira de Santana, 25 de maio de 1997
Os participantes de I Semana Social da Bahia
Ágata Esmeralda | Eventos |