A Terra e o povo de Jesus

"Infeliz de você
que nasceu mulher!"


Credo, tio! Que título mais besta! Você é muito machista!

- Calma, gente! Calma! Vocês logo irão entender. Primeiro, vou lembrar uma história do evangelho de São João (capítulo 8).

Jesus estava no templo de Jerusalém, sentado num canto, ensinando as coisas bonitas de sempre. E o povo ali, escutando. Maravilhoso, esse Jesus!

De repente, lá vêm eles, os doutores da lei e os fariseus. Arrastam consigo uma mulher, que colocam bem no centro da roda. Tinha feito coisas que não devia...


"MELHOR APEDREJAR!"

- Pegamos essa mulher em flagrante - disseram eles a Jesus. - O que o senhor acha? Sabe como é: a lei de Moisés manda apedrejar esse tipo de mulheres...

"Eles diziam isso para pôr Jesus à prova e ter um motivo para acusá-lo", escreve João.

Os doutores da lei e os fariseus estavam eufóricos. Dessa, Jesus não escaparia. Ele que não era bobo de dizer que a lei estava errada! Seria encrenca na certa.

Mas, se concordasse que era para fazer o que a lei mandava, estaria condenando a mulher à morte. E aí, como é que ficava com os seus ensinamentos?

E agora, Jesus?


SAÍRAM DE FININHO

Acontece que Jesus não era bobo. Também não estava nem um pouquinho a fim de entrar na jogada deles.

João conta que Jesus inclinou-se e começou a escrever no chão com o dedo. Os doutores da lei e os fariseus continuaram insistindo na pergunta. Então, Jesus se levantou e disse:

- Quem de vocês não tiver pecado, atire nela a primeira pedra!

E, inclinando-se de novo, continuou a escrever no chão.

Ouvindo isso, eles foram saindo um a um, começando pelos mais velhos...

- Pô, que cacetada!

- Olha a boca, Quindim! Tio, dá uma bronca nele!

- Bronca? Quero mais é terminar de contar a história.

Jesus então se levantou e perguntou:

- Mulher, ninguém condenou você?

- Ninguém, Senhor! - ela respondeu.

- Eu também não condeno. Pode ir, e não faça mais essas coisas!


O QUE SE DIZIA

"A mulher - diz a lei - é inferior ao homem em todas as coisas. Ela deve obedecer. Não para se humilhar, mas para ser dirigida, pois foi ao homem que Deus deu o poder."

Quem é que disse isso? O famoso Flávio Josefo.

"Louvado seja Deus que não me criou mulher", costumavam rezar os homens da terra de Jesus.

Assim era a coisa. Para o homem, tudo. Para a mulher, nada, ou quase nada. Em vários aspectos, a situação da mulher não era muito diferente da situação de um escravo.

Era considerada propriedade do marido. Tinha que cuidar da casa, dos filhos. Tinha que obedecer, sempre. Se não conseguia ter filhos, era desprezada.

O marido, se arranjava outros amores, não acontecia nada. Muitas vezes, por qualquer motivo, podia dispensar a mulher. Por exemplo, uma comida malfeita. Ou vai que encontrava uma mulher mais bonita... Coisas assim.


ESPAÇOS RESERVADOS

No templo, a mulher só podia entrar até um certo ponto: havia um espaço reservado para ela. Na sinagoga (a casa de reunião e de oração), uma barreira separava as mulheres dos homens.

Podia haver até quinhentas mulheres na sinagoga, mas se pelo menos dez homens adultos não estivessem presentes, a celebração não podia começar. A mulher não podia fazer as leituras, nem dizer o que pensava e sentia quando um dos homens presentes tivesse acabado de ler.

Já desde a infância, o menino e a menina eram tratados e educados de forma diferente. O menino freqüentava a escola, e quanto mais aprendesse, melhor. A menina, não. Nada de escola, e quanto menos se ensinasse a ela, melhor. Devia aprender somente a fazer "coisas de mulher". Em alguns casos, a menina podia ser vendida como escrava.

Uma mulher não podia ser testemunha num tribunal. Não podia pedir divórcio. Se tivesse mesmo que sair de casa, precisava usar um véu na cabeça. Ninguém devia conversar em público com uma mulher casada, nem cumprimentá-la.

- Nossa, tio! Era muito pior do que hoje...

- Era diferente. Os tempos também eram outros. Os costumes eram outros...

Claro que o quadro nem sempre era tão sombrio. No interior do país, a situação não era tão dramática. Havia mais liberdade, mais participação. Os mais pobres tinham o seu jeito próprio de ver e fazer as coisas.

Porém, em geral, a mulher era discriminada. Muito discriminada!


ACOMPANHANTES DE JESUS

Maria Madalena, Joana, Susana... São os nomes de algumas das mulheres que acompanhavam Jesus o tempo todo, em suas andanças de um lado para o outro. Havia outras, várias outras, escreve o evangelista Lucas.

Mulheres que tinham sido curadas por Jesus. Mulheres apaixonadas pela mensagem que Jesus anunciava. Uma mensagem diferente. De igualdade e fraternidade.

Era bom e era muito lindo acompanhar Jesus. Era um prazer ajudar a Jesus e aos discípulos dele. Uma alegria!

E quando Jesus foi pregado na cruz, lá estavam elas, as mulheres. Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago, Salomé e muitas outras mulheres, escreve Marcos.

Um dia - conta Lucas -, quando entrou num povoado, Jesus foi recebido na casa de uma mulher de nome Marta. A irmã de Marta, chamada Maria, sentou-se aos pés de Jesus e ficou escutando o que ele dizia e ensinava.

Marta estava ocupada. Tinha muito o que fazer. Precisava cuidar bem da visita. E Maria, ali, escutando Jesus, bem sentadinha aos pés dele.

- Senhor, não te importas que minha irmã me deixe sozinha com todo o serviço? - perguntou Marta a Jesus. Estava meio revoltada: - Manda que ela venha me ajudar!

- Marta, Marta! - respondeu Jesus. - Você se preocupa e anda agitada com muitas coisas. Porém, uma só coisa é necessária. Maria escolheu a melhor parte, e esta não lhe será tirada.


JESUS NÃO DISCRIMINA

Há algo muito curioso nesse episódio. Maria, sentada aos pés de Jesus, ouvindo e aprendendo o que ele tinha a ensinar. Maria, fazendo-se discípula de Jesus. Coisas que não aconteciam naquela época.

A mulher tinha, sim, que cuidar da casa. Não tinha que se sentar aos pés de um mestre, aprender... Só mesmo Jesus, o grande Jesus!

No história do mês passado - "Jesus estava no maior papo com a samaritana" -, encontramos Jesus na beira de um poço, conversando com uma mulher desconhecida. Uma estrangeira. Uma samaritana - Deus que me livre!

Jesus não discrimina. Porque homem não é maior nem melhor do que mulher. Ambos são iguais diante de Deus. Homem é filho e mulher é filha de Deus.

Jesus conversa com as mulheres, escuta os pedidos delas, compreende, ajuda, cura. Ele critica duramente o costume que dava ao homem todo direito de se divorciar. Com Jesus, a mulher se sente respeitada, gente.


NÃO ACREDITARAM

Mateus, Marcos, Lucas e João - os quatro evangelistas - lembram muitos episódios da vida de Jesus em que as mulheres se fazem presentes, participam, são reconhecidas.

Um desses episódios vale a pena ser lembrado. É Lucas quem conta, no capítulo 24.

Bem de madrugadinha, no terceiro dia após a morte de Jesus, elas foram ao túmulo dele, levando perfumes. Eram Maria Madalena, Joana, Maria, mãe de Tiago, e outras mulheres, cujo nome a gente não fica sabendo.

Chegando ao túmulo, viram que o corpo de Jesus não estava lá. "Ele não está aqui! Ressuscitou!" - anunciaram os anjos.

Então, as mulheres se lembraram das palavras de Jesus... Alegres, correram para dar a notícia aos apóstolos e a todo mundo que encontravam pelo caminho.

"Contudo, os apóstolos acharam que eram tolices o que as mulheres contavam e não acreditaram nelas", escreve Lucas.

Ah, esses apóstolos!

Depois, viram que era verdade. E se alegraram também. Muito.

As mulheres, porém, se alegraram primeiro. Porque acreditaram primeiro. Porque anunciaram primeiro. Viva! Viva!

Dimas A. Künsch



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