Todos os santos, todos

Por exemplo, Benedito

A vida do santo negro que conquistou o coração dos brasileiros e se tornou um dos mais populares do país.


Cristóvão e Diana, os pais de Benedito, viviam na Sicília, sul da Itália e região mais pobre do país. Eram descendentes de escravos trazidos da Etiópia, país do leste africano. Libertos por seus senhores, herdaram deles o sobrenome Manassari, como era costume.

Benedito nasceu no ano de 1526 e teve três irmãos: Marvos, Baldassara e Fradella.

Quando criança, foi pastor de ovelhas e, mais tarde, lavrador. Aos 18 anos, decidiu consagrar a vida a Deus. Enquanto refletia nesse ideal, comprou uma junta de bois para lavrar a terra e melhor ajudar a família, que era pobre.

Assim chegou aos 21 anos.


FAMA DE HOMEM SANTO - Convidado por um monge, foi viver entre os Irmãos Eremitas de São Francisco. Ali, professou os votos de pobreza, obediência e castidade. E também um quarto voto, o de vida quaresmal, que implicava em viver a vida toda fazendo penitência e sacrifícios, os mais duros.

Como eremita, Benedito foi além da simples observância, e logo adquiriu fama de homem bondoso e santo. As pessoas da região o procuravam para serem curadas de seus males, e ele atendia e ajudava a todos.

Sentindo-se atrapalhado no meio de tanta gente, Benedito fugiu. Tinha prometido viver no silêncio e na solidão.

Além disso, era humilde. O povo sentia que Benedito operava prodígios, mas ele protestava: não era ele quem curava as pessoas, e sim Maria Santíssima.


COZINHEIRO DO CONVENTO - Passados dezessete anos no deserto, Frei Benedito teve que escolher entre um dos conventos aprovados pela Santa Sé. Foi dispensado do quarto voto (o de vida quaresmal), visto que o papa da época, Pio IV, desejando unificar mais a Ordem Franciscana, assim o ordenara.

Depois de muito rezar e pensar, Benedito escolheu os Capuchinhos, cuja regra de vida mais se assemelhava à sua antiga.

Foi então para o convento de Santa Maria de Jesus, em Palermo. Depois, passou pelo convento de Sant'Ana di Giuliana, voltando em seguida para o primeiro, onde permaneceu até a morte.

No convento, foi escalado para ser cozinheiro.

Pastor, lavrador e, agora, cozinheiro - ele que já era um homem requisitado, perseguido pela multidão em busca de uma cura, de uma oração, de uma bênção.


SUPERIOR DO MOSTEIRO - Como narram suas biografias, com Benedito aconteceu um fato talvez inédito nos anais das ordens religiosas. Apesar de ser leigo, analfabeto, filho de escravos e negro, um dia tornou-se superior do mosteiro e modelo admirável na direção da comunidade.

Foi eleito pelos seus irmãos de comunidade, sensibilizados pela sua santidade, prudência e sabedoria. Triste e humilhado, correu para junto de seu superior, implorando que ele o dispensasse de cumprir essa ordem. Tinha sido promovido sem querer.

Inculto e ignorante do ponto de vista dos letrados deste mundo, Benedito porém entendia como poucos das coisas de Deus. Passou a ser o mais disciplinado de todos os confrades e governava mais pelo exemplo e pela oração que por qualquer outro meio. Sua presença já era um estímulo para que os outros fossem bons, e melhores.

No próprio repreender, Benedito o fazia com amor e cuidado. Se, por acaso, por algum motivo, repreendia com severidade maior, ou injustamente (como fez uma vez, levado por falsas informações), pedia perdão com humildade, e na frente de todos.


SÁBIO ANALFABETO - Nos rigorosos processos de beatificação e canonização foi atestado com juramento, por inúmeras testemunhas, que Benedito era inculto, analfabeto, filho de escravos.

A única conclusão a que todos puderam chegar era a de que ele possuía o dom da ciência infusa, isto é, em outras palavras, era iluminado pelo Espírito Santo, com todos os seus dons. E, assim, iluminado pelo Espírito Santo, esclarecia aos mais doutos e ilustres letrados de seu tempo a respeito de teologia, sagradas escrituras e outras questões de moral, dogma, etc.

Até mesmo em questões de consciência, que os mais importantes mestres de seu tempo iam lhe propor - consultando-o sobre a solução mais acertada, a interpretação mais correta -, tinha sempre uma palavra plena de sabedoria.

Descobria os segredos dos corações, penetrando no íntimo das pessoas, dispensando-as de entrarem em explicações a respeito de seus problemas, que ele sabia sem ninguém lhe ter contado.

Além da Itália, também Portugal e Espanha conheceram Benedito ainda em vida. Conheceram seus milagres e profecias.


SENHORA POBREZA - À semelhança de Jesus, Benedito identificava-se com os mais pobres e se compadecia de seus males. Amava a Senhora Pobreza, a exemplo de São Francisco de Assis.

Vestia-se modestamente, com um velho e remendado hábito. Sempre descalço, nada acrescentava, nem uma sandália, quando o frio apertava, a ponto de nevar. Nem coberta. Nem colchão.

Na igreja de Santa Maria de Jesus é representado com um lírio na mão, simbolizando a pureza em que vivia.

Fugia das multidões que o veneravam, por humildade. A admiração e a gratidão das pessoas eram consideradas por ele um martírio.

Proclamava-se o maior pecador do mundo - ele, a quem tanta gente chamava santo.

Procurava os ofícios mais desprezados, e quanto mais elevado e elogiado era, mais se entristecia.

Prudente, justo, forte e dotado de temperança, espírito de penitência e de oração, era devoto de São Miguel Arcanjo, São Pedro e São Paulo, São Francisco de Assis, Santa Úrsula e especialmente Nossa Senhora, a quem atribuía as maravilhas que operava.


MORTE DE UM SANTO - Em 1859, Frei Benedito adoece por duas vezes. Da primeira, contra todas as expectativas e a convicção do médico, cura-se. Na segunda, um mês depois, sofre por 29 dias seguidos.

Conta-se que um dos frades do mosteiro, vendo-o de olhos fechados e imóvel, e julgando-o morto, acendeu uma vela e já ia colocá-la em suas mãos. "Meu filho - diz o santo -, ainda não chegou a hora. Quando chegar, eu aviso!".

Morto, cumprindo sua vontade, foi enterrado logo, na vala comum, sem distinção de espécie alguma.

O povo todo estava ausente, pois havia uma festa muito popular em Palermo nesse dia. Contudo, logo que a notícia se espalhou, correram todos para o convento de Santa Maria de Jesus, a 3 quilômetros da cidade.

Não sobrou nada que pudesse ser retalhado, despedaçado, dividido, para servir de relíquia do santo.

Dois anos depois de sua morte, seu corpo foi transferido, e hoje repousa no altar da igreja de Santa Maria de Jesus.

Em 1807, depois de um processo lento, longo e minucioso, foi canonizado. Já era santo antes, porém, na devoção do povo.

De Portugal, chegou ao Brasil. E hoje é um dos santos mais populares de nossa terra, de norte a sul.

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Com informações extraídas do livro São Benedito: um santo negro. Vida de São Benedito narrada para o homem de hoje, de Cleusa M. Matos de Barros. São Paulo, Paulinas, 4ª edição, 1989.


Benedito Brasileiro

Já em 1686 (e, segundo alguns historiadores, em data anterior) - portanto, mais de um século antes de sua canonização (1807) -, São Benedito era venerado na Bahia, com toda pompa e esplendor, tendo nesse ano seguido para aprovação de Roma os estatutos da Irmandade do Bem-aventurado Frei Benedito de Palermo.

Da Bahia e do Maranhão, onde se encontravam os maiores contingentes de escravos negros, espalhou-se sua devoção para o resto do Brasil.

Hoje não há cidade, vila ou povoado que não dedique uma igreja ou pelo menos um altar ao santo. E a Irmandade de São Benedito é a que conta com o maior número de filiados, entre todas.

Não há procissão tão concorrida como a de sua festa. Dela participam até mesmo os que não têm outra ligação com a Igreja, a não ser o santo negro.

Foram sem dúvida os religiosos franciscanos vindos de Portugal que introduziram o culto a São Benedito no Brasil. Negro e filho de escravos, está entre os santos mais venerados do país, por todas as raças, camadas sociais, idades, sexos, mas sobretudo por negros e empobrecidos.

Em muitas cozinhas brasileiras não falta uma imagem do santo. Mas ele não é apenas o patrono de todos os cozinheiros e cozinheiras. É um santo. É alguém que viveu o Evangelho. É um modelo de homem livre.


Cântico

São Benedito, que é tão simples como nós,
sabe quem somos, vai ouvir a nossa voz (bis).

Quem é esse negro que nós homenageamos?
É o filho de uma escrava, uma negra de valor.
Dona Diana, mulher santa, braço forte,
ensinou o seu negrinho a ser um trabalhador.

E certo dia, Benedito e seus amigos
descobriram outro modo de servirem a Jesus.
O Benedito foi ser frade franciscano,
continuou vivendo santo, muita graça, muita luz.

O Santo Negro, que é nosso protetor,
sempre amou a sua gente, a sua raça desprezada.
Ele não tinha nem dinheiro e nem leitura,
mas sabia dar lição a muita gente preparada.

Quem é o santo que nós homenageamos?
É o negro poderoso, sua força é o Divino.
Todos os negros e os pobres desta terra
são irmãos de Benedito, protetor dos pequeninos.


Em: "Vai, meu povo"
Diocese de São Mateus/ES