MUTIRÃO PELA VIDA:
NOVO JEITO DE LER A BÍBLIA


PROFECIA: GRITO DOS POBRES,
RUGIDO DE DEUS!


Caminhamos pela Bíblia e pela vida. Nosso passeio vai contemplar os Profetas. Vamos nos deter no livro de Amós.


O rosto de Profeta


Qual é o perfil de um profeta? O profeta, homem ou mulher, é uma pessoa criativa que encontra sempre uma saída. Seu olhar vai além do que toca com mão. Sabe intuir a realidade que está aparentemente do outro lado do muro e que faz sofrer, como são os sistemas de opressão e injustiça. Talvez porque tem um olhar de fogo, um olhar penetrante como aquele de Deus, consegue descobrir coisas que estão a ponto de acontecer ou que já estão acontecendo, que estão diante do olhar do comum dos mortais, mas que, porém, ninguém fala. Falar é arriscado!

O profeta sabe dar nome às realidades mais difíceis. Opta por pequenos sinais de vida e justiça. Seu dedo aponta para fatos concretos, para uma nova sociedade. Faz denúncias precisas e assinala um horizonte amplo, onde todos, começando pelos empobrecidos, encontrem lugar.


O profeta "é a voz de Deus, é a voz do povo; de um Deus fiel, libertador ao nosso lado" diz um cântico das comunidades. O profeta tem a humildade e a coragem de falar com Deus, cara a cara, como amigo, como fazia Moisés (Ex 33,11), Abraão (Gn 18,16-33), Elias.... O Deus da Aliança está no coração do profeta por isso vai reclamar do povo quando este virar as costas a Deus, largar o compromisso assumido ou esquecer a Aliança. O profeta vai clamar junto com o povo, quando alguém explorar o pobre por uma camiseta ou por um par de chinelos.


O profeta faz uma experiência forte de Deus e por isso sua língua parece uma espada afiada, que não deixa dormir tranqüilo (Is 49,2; Hb 4,12; Ap 1,16;19,15). O seu falar é um grito que acorda. O profeta sabe ler e interpretar o coração das pessoas e o coração de Deus. Coloca a prática da justiça e o culto no centro de seus cuidados e atenções, por isso vai ficar atento a tudo que acontecer nos santuários e ver se agrada ou não a Deus.


Um camponês vira profeta


Quem não sonhou, alguma vez, em ser profeta? Mas, a vida dos profetas mostra que ninguém se proclama a si próprio profeta. Ser profeta é um chamado de Deus. Vai além de gostar ou não gostar. Amós confessa: "Ai de mim se eu não disser..." Amós enfrenta uma realidade desafiadora: Pobre vendido por um saco de cimento. Outro, por um par de chinelos. Outro, enfim, por uma camiseta! As injustiças, tantas!


Essa realidade estava diante de todos. Também Amós viu essas situações. Mas, daí a se animar a profetizar era outra coisa. Quando o chamado de Deus chegou aos seus ouvidos, deixou passar um tempão. Mostrou resistência a profetizar. Como Moisés, ele também achava a experiência forte demais para suas costas. Amós só aceitou quando descobriu "o rugido de Javé como leão" (Am 1,2; 3,1-8), então, convencido, assumiu profetizar! O camponês de Técua, deixou seu gado, saiu da sua terra.


Amós passa em revista o dia-a-dia e descobre montões de opressões, violências e rapina nos palácios de Samaria (3,9-10); em Israel descobre casas e mais casas: casa de inverno, casa de verão, casas de marfim! (3,15). Luxo e grandes festas: "deitados em leitos de marfim, estendidos em divãs, comem cordeiros do rebanho e novilhos do curral..., bebem crateras de vinho e se ungem com o melhor dos óleos, mas não se preocupam com a ruína de José" (6,4-6). Denuncia as mulheres da classe alta de Samaria (4,1-3) e condena, em nome de Deus, festas, reuniões, holocaustos e oferendas de Israel ( 5,21-27).


Amós, descobrindo tanta coisa, vai pronunciar palavras de fogo para Judá, e para os povos vizinhos: Damasco, Gaza e Filistéia, Tiro e Fenícia, Edom, Amon, Moab (Am 1,1-2,5).


Para Israel, sobretudo, parece concentrar sua força e denúncia (Am 2,6-16). Anuncia castigo e deportação para o rei de Israel. O sacerdote Amasias, a serviço do rei, vai acusar Amós de conspirar contra a casa de Israel. Tenta expulsá-lo, e o profeta diz que foi Deus quem assim quis, que ele nem pensava nisso quando estava no seu roçado. Se Amós fala assim é porque Deus mandou!


Sede de Justiça, Sede de Deus


Uma pessoa é grande quando está disposta a arriscar a própria vida por uma grande causa. Qual é a causa dos profetas? A causa deles é a justiça. Amós sonha com justiça: "Que o direito corra como a água e a justiça como um rio caudaloso" (Am 5,24).


Amós devia contemplar um panorama muito deserto para chorar por tanta água: O deserto da injustiça! As injustiças denunciadas são graves. É só ter a coragem de ler esses textos e ver a paixão de Amós pela Justiça e pelos Pobres explorados. Como Oséias e Jeremias, Amós chama a atenção para prática da justiça e para o conhecimento de Deus, procurando o bem e não o mal. Para Amós, como para todos os profetas, acreditar em Deus tem a ver com praticar a justiça e se preocupar com os pobres.


Chama logo a atenção em Amós que, sendo um profeta do interior, ficou tão atento às situações de injustiça internacional. E ainda, seu olhar era tão profundo que nessa leitura da realidade descobre a presença libertadora de Javé no meio de outros povos como os filisteus, etíopes e os arameus (Am 9,7): "Não são vocês para mim como os cuchitas, ó filhos de Israel? Não fiz Israel subir da terra do Egito, os filisteus de Cáftor e os arameus de Quir? - oráculo de Javé". Do mesmo modo como Deus fez subir Israel de Egito, fez também subir os filisteus e os arameus, povos não muito amigos de Israel!


No coração de Amós, junto com o sonho da justiça, aninhava também uma grande sede e fome da palavra de Javé. Chegava a dizer: tomara que todo o povo tenha Sede e Fome da Palavra, assim terão vida e esperança ( Am 8,11-12). Dessa fonte bebia Amós para profetizar.


Hoje também encontramos profetas no meio das comunidades. Alguns são reconhecidos, como por exemplo, Dom Pedro Casaldáliga, bispo de São Félix do Araguaia que recebeu o "Prêmio pela paz" das Nações Unidas, na Espanha, ou o Movimento Sem Terra, que recebeu um prêmio a nível internacional pelo Rei da Bélgica.


Os profetas, mesmo que não sejam reconhecidos por todos, não por isso deixam de ser apelo de Deus à mudança de vida, à prática da justiça e da solidariedade.


Justino Martínez Pérez


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