/** ong.gestao: 12.0 **/
** Topico: I/Genero e Desenv. Institucional em ONGs **
** Escrito em 6:25 AM Dec 23, 1996 por omar em ax:ong.gestao **
*Genero e Desenvolvimento Institucional em ONGs* e' uma
publicacao lancada em 1995 pelo Nucleo de Estudos Mulher e
Politicas Publicas do IBAM e pelo Instituto de la Mujer.
Trata-se de uma coletanea de artigos de varios autores,
resultado de um projeto de capacitacao para liderancas de ONGs
de mulheres desenvolvido pelo IBAM, com apoio do Instituto de la
Mujer do governo espanhol.
A publicacao tem por objetivo incorporar a discussao da
perspectiva de genero 'a teoria organizacional.
O conjunto de artigos oferece uma boa visao
historica da problematica da mulher desde os anos 60 e sua
repercussao sobre aspectos institucionais das organizacoes das
mulheres, assim com da teoria organizacional, apresentando os
varios enfoques e politicas desenvolvidas ao longo do tempo. Os
assuntos abordados sao validos e atuais nao apenas para as
organizacoes de mulheres, mas para toda e qualquer ONG. Sao
artigos curtos, com uma linguagem fluida, uma leitura oportuna
para aquelas/es que desejam se iniciar na discussao sobre genero
e organizacao institucional. [O quarto artigo, sobre a
"comercializacao" dos servicos das ONGs e' particularmente
importante no contexto atual.]
* IBAM - INSTITUTO BRASILEIRO DE ADMINISTRACAO MUNICIPAL
Nucleo de Estudos Mulher e Politicas Publicas
Largo do IBAM, 1 - Botafogo
22.282 - Rio de Janeiro - RJ
Tel: 021 - 537 7595
Fax: 021 - 537 1262
** Fim do texto de ax:ong.gestao **
/** ong.gestao: 12.1 **/
** Escrito em 6:28 AM Dec 23, 1996 por omar em ax:ong.gestao **
A expressao "genero", que pretende diferenciar a dimensao social
da dimensao biologica que a palavra "sexo" carrega em si, e'
abordada, 'a guisa de introducao, em artigo de Maria Luiza
Heilborn. A autora resgata as pesquisas que originaram esse novo
entendimento, as quais evoluiram de analises que falavam de
"papeis sexuais" de homens e mulheres para se falar em
"construcao social do genero". Essa nova abordagem pretende
destacar a influencia preponderante da cultura sobre a formacao
da personalidade e dos papeis exercidos socialmente por homens e
mulheres.
Experiencias diferenciadas vivenciadas desde a infancia, como
aquelas relacionado ao tempo disponivel e ao espaco, levam a
diferentes conformacoes sociais. Uma pesquisa com criancas de
ambos os sexos de familias de baixa renda demonstrou, por
exemplo, que criancas do sexo masculino dispoe de mais tempo
para brincar e que as criancas do sexo feminino vao assumindo
desde cedo tarefas domesticas. Da mesma forma, vai se
diferenciando o espaco em cada cada qual e permitido transitar
(na rua ou no espaco domestico).
Com isso, a autora conclui que, considerando-se a perspectiva de
genero, a formulacao e o planejamento de politicas deve
considerar a variedade das experiencias sociais de homens e
mulheres. Nesse contexto, a autora diferencia politicas que
consideram as necessidades praticas de genero - como aquelas
destinadas `a melhoria da situacao da mulher em suas atuais
atribuicoes, o que, na realidade, beneficiaria a todos - e
aquelas politicas que consideram as chamadas "necessidades
estrategicas de genero", voltadas para reverter a situacao da
distribuicao desigual de papeis entre homens e mulheres.
** Fim do texto de ax:ong.gestao **
/** ong.gestao: 12.2 **/
** Escrito em 6:29 AM Dec 23, 1996 por omar em ax:ong.gestao **
O segundo artigo, de autoria de Maria Luiza Heilborn e Angela
Arruda, esboca um panorama historico do movimento de mulheres.
O artigo aborda o surgimento do movimento feminista mundial na
decada de 60 dentro do cenario de contestacao da ordem social
vigente, ao lado de outros movimentos de protesto como o
movimento hippie, o movimento pacifista, as lutas pelo
reconhecimento dos direitos das minorias, a rejeicao pelas
instituicoes, etc. Os movimentos de mulheres surgidos no Brasil
e' ai' contextualizado.
As autoras destacam como particularidade do surgimento do
movimento de mulheres no Brasil as lutas em torno de questoes
relacionadas a valores associados 'a maternidade e ao papel da
mulher na sociedade. Assim, surgiram, na decada de 60, o
Movimento de Mulheres pela Anistia, que cobrava do regime o
paradeiro de seus familiares. Na decada de 70 esta tendencia
permanece com o Movimento Contra a Carestia e o movimento de
luta por creches. Estas lutas abriram as portas do movimento
sindical para a massiva sindicalizacao de mulheres e fizeram com
que surgissem varios grupos de tendencia feminista no pais.
Nesse contexto surgem duas denominacoes para a acao das mulheres
pela ampliacao da cidadania: "movimento de mulheres" que nao
explicita a ideia de que ha' uma hierarquia sexual e nao
questiona a divisao sexual do trabalho, enquanto que o
"movimento feminista" compromete-se com uma critica radical aos
papeis de genero como produto da estrutura social.
Com o esgotamento dos movimentos sociais e a institucionalizacao
das ONGs, a causa feminista tambem se profissionaliza. Nas
instituicoes se instala, desta forma, uma "cultura do
feminismo", que estaria comprometida com a igualdade e a
liberdade, dois valores que constituem os pilares da critica
feminista. Com isso, a discussao em torno da organizacao do
movimento se da' em torno de questoes como representacao,
participacao direta e paritaria, nao monopolio da palavra ou da
informacao, na rotatividade de eventuais funcoes, nao
especializacao de funcoes e nao delegacao de poderes. "Em suma,
prega-se uma horizontalismo na organizacao como perfeita
encarnacao dos principios organizativos da democracia
radical."(pag.20)
Essa concepcao, no entanto, teria levado, na pratica, a um
perfil institucional pautado por uma pratica espontaneista,
avessa 'a programacao e 'a hierarquia, 'a direcao e ao controle,
ao mesmo tempo em que, nas metodologias de trabalho, passou-se a
se valorizar a emocao e a sensibilidade.
De acordo com as autoras, uma das dificuldades nas organizacoes
feministas e' justamente implantar nas suas estruturas
organizacionais um ideario que e' apenas um conjunto de
principios do pensamento feminista, com algumas aplicacoes nao
sistematizadas.
Assim, surgem tensoes relacionadas 'a tomada de decisao e ao
exercicio do poder, assim como aquelas relacionadas ao perfil
das funcionarias das ONGs feministas o qual, no contexto de
exigencia de uma maior profissionalizacao, aparece em
contradicao com a questao da militancia. Outro problema que
surge e' o ativismo, levando 'a dispersao de forcas, 'a perda da
visao dos limites e possibilidades, "como se o anti-hierarquismo
feminista se transpusesse para a organizacao das tarefas" (pag.
24). A aplicacao do principio da democracia radical - atraves do
horizontalismo, teria gerado, por sua vez, o democratismo,
levando 'a perca de agilidade. Paradoxalmente, este levou 'a
afirmacao de liderancas carismaticas, detentoras dos valores,
identidade e experiencias, favorecendo a centralizacao,
justamente aquilo que se desejou combater.
Para as autoras, embora esses problemas sejam caracteristicos
para o conjunto das ONGs, nas ONGs feministas, eles adquirem um
significado maior. O ativismo, por exemplo, significa para o
mundo das ONGs feministas, a ruptura com o universo domestico e
a entrada na esfera publica, onde as mulheres vao se firmar, ao
mesmo tempo, como militantes e como profissionais.
As autoras do texto concluem que e' necessario se repensar a
logica da democracia radical, considerando-se as novas
exigencias de profissionalizacao, atraves da modernizacao do
funcionamento, sem que se perca, no entanto, a visao
participativa, democratica e criativa.
** Fim do texto de ax:ong.gestao **
/** ong.gestao: 12.3 **/
** Escrito em 6:30 AM Dec 23, 1996 por omar em ax:ong.gestao **
O terceiro texto, de autoria de Menchu Ajamil, trata da questao
de genero no contexto da cooperacao internacional.
A autora traca a trajetoria das questoes relacionadas 'a mulher
no ambito das politicas das Nacoes Unidas. E' abordado desde os
programas de controle da natalidade, quando a pobreza era tida
como consequencia direta da fecundidade, 'as teses que
demonstraram, mais tarde, a relacao dos niveis educacionais e a
participacao economica da mulher com a fecundidade, apontando
para a necessidade de inserir a mulher nas estrategias de
desenvolvimento.
Assim, o texto oferece uma retrospectiva dos momentos mais
relevantes da politica da ONU que colocaram a tematica da mulher
em evidencia no cenario da cooperacao internacional, assim como
os diferentes enfoques conceituais que embasaram as politicas ao
longo do tempo.
O "enfoque do bem-estar", um dos mais antigos, esta' voltado
para a definicao de estrategias direcionadas aos assim chamados
"grupos vulneraveis". As acoes estao voltadas para mulheres de
baixa renda, privilegiando-se suas funcoes reprodutivas na
qualidade de esposas e maes. O resultado pratico desta politica
foi, de um lado, o incremento da capacidade produtiva da forca
de trabalho masculina e, de outro lado, a promocao do bem-estar
social dos grupos socialmente vulneraveis (portadores de
deficiencias, doentes e criancas) atraves de programas voltados
para a mulher.
De acordo com a autora, este enfoque se apoia em premissas de
que as mulheres sao receptoras passivas do desenvolvimento e que
o papel de educar e socializar os filhos e' sua funcao. Da mesma
forma, ele deixa ambigua quem, na realidade, seriam os
verdadeiros beneficiarios dos programas - se as mulheres ou a
familia e a comunidade.
O "enfoque da equidade" parte do principio de que os modelos de
desenvolvimento economico tem tido um impacto negativo sobre as
mulheres no momento em que elas nao tem sido integradas nos
setores produtivos, tendo ficado marginalizadas nos setores de
subsistencia e setores informais da economia. Este enfoque
incorporou o debate sobre a igualdade de oportunidades entre
homens e mulheres no setor produtivo, dando enfase 'a
independencia economica das mulheres como sinonimo de
igualdade. Com isso, deveriam ser definidas politicas
diferenciadas de modo a conceder 'as mulheres vantagens
competitivas que as possibilitem reduzir as desvantagens em
relacao aos homens por estarem muito tempo longe do mercado de
trabalho.
O "enfoque da anti-pobreza" defende que a desigualdade entre
homens e mulheres nao esta' ligada na subordinacao das mulheres
aos homens, mas 'a pobreza. Ele parte do principio de que,
quanto maior a situacao de pobreza, mas as mulheres sao exigidas
em seu papel reprodutivo nas familias de baixa renda.
Assim, da reducao da desigualdade entre homens e mulheres, a
enfase passa a ser o aumento da renda das mulheres. As acoes
procuram, entao, incrementar as opcoes de emprego e renda e
acesso aos meios de producao atraves de projetos de geracao de
renda. O resultado pratico desta politica foi a proliferacao de
projetos de geracao de renda para as mulheres, "os quais foram,
na maioria, concebidos de maneira domestica. O fato de ter-se
diferenciado em projetos de "micro-empresas" para os homens e
"projetos de geracao de renda" para as mulheres, foi indicativo
do carater secundario outorgado ao trabalho produtivo das
mulheres"(pag. 32/33).
O "enfoque da eficiencia" e' aquele, segundo a autora, que tem
tido mais popularidade atualmente por parte das agencias
internacionais de cooperacao. Ele defende a tese de que a
participacao economica da mulher resulta na uniao da eficiencia
e da igualdade na distribuicao de rendas.
Para a autora, esse enfoque nao significa necessariamente uma
melhoria nas condicoes de vida e trabalho para as mulheres. Por
coincidir com um momento de ajuste estrutural da economia
mundial, este enfoque tem, na pratica, deslocado os custos da
economia remunerada para a economia nao-remunerada, na medida
que privilegia a mulher na producao de bens e servicos
comunitarios.
O "enfoque da aquisicao e geracao de poder" procura, por sua
vez, o fortalecimento da mulher nao necessariamente pelo vies
economico. Ele busca aumentar a auto-confianca da mulher e
contribuir para o desenvolvimento de habilidades que lhes
permitam o controle sobre os recursos materiais e imateriais.
Os diferentes enfoques levam a estrategias e formas de abordagem
e intervencao diferenciadas e a resultados igualmente diverso.
Os enfoques da "anti-pobreza" e da "eficiencia", embora com
enfases diferentes, procuram dar respostas 'as assim chamadas
"necessidades praticas de genero", sem, no entanto, darem
respostas 'as "necessidades estrategicas", ou seja, aquelas
necessarias para gerar mudancas na relacao de subordinacao. Por
outro lado, a estrategia de "aquisicao e geracao de poder" lanca
aos ombros das mulheres e suas organizacoes as responsabilidades
sobre as mudancas sociais, subvalorizando o papel do Estado e
das instituicoes na promocao das desejadas mudancas.
Mais recentemente, a concepcao de genero contribuiu para a
superacao da visao sobre os diferentes papeis que homens e
mulheres desempenham na sociedade para examinar a relacao entre
eles. Essa concepcao sugere que as estrategias de intervencao da
perspectiva de genero. Nao devem se limitar 'as mulheres ou 'as
causas da subordinacao, olhando-as tao-somente do ponto de vista
das mulheres.
** Fim do texto de ax:ong.gestao **
/** ong.gestao: 12.4 **/
** Escrito em 6:30 AM Dec 23, 1996 por omar em ax:ong.gestao **
O quarto texto, de Paulo Roberto Motta, aborda aspectos
relacionados 'as estrategias gerenciais de organizacoes nao-
governamentais sem fins lucrativos e a necessidade de sua
adequacao quando se deseja garantir a sustentacao financeira por
meios comerciais.
O autor aborda a crescente necessidade das ONGs se preocuparem
com o fator comercial, nao como uma politica revisionista de sua
missao, mas como uma politica de autopreservacao, para a
sobrevivencia da entidade.
Nesse contexto, o autor aponta algumas contradicoes entre a
missao social e a necessidade de sobrevivencia atraves de
mecanismos comerciais. Ate' entao, a existencia da organizacao
era justificada apenas pela relevancia de seus objetivos
sociais. No novo modelo, quando o aspecto comercial determina a
forma de sobrevivencia, a rentabilidade financeira passa a ser
uma das medidas que determinam a relevancia. Um outro aspecto se
refere ao estimulo do crescimento, que, ao se basear, na
perspectiva anterior, na consecucao dos objetivos sociais,
levava ate' 'a expansao do trabalho. Da nova perspectiva, o que
vale e' a moderacao do crescimento ou ate' mesmo reducao dos
objetivos sociais em funcao dos recursos financeiros
disponiveis. Antes, caracterizava a acao da entidade a recusa a
pressoes externas que viessem a desvirtuar seus objetivos e sua
missao. Hoje se verifica uma certa predisposicao em aceitar
pressoes externas e ate' mesmo desvirtuamento da missao
institucional. Se na postura anterior se buscava estimular o
espirito altruista para gerar dedicacao ao projeto, hoje se
busca introduzir mecanismos de organizacao interna com regras e
normas de funcionamento. Por fim, as ONGs possuiam a capacidade
de atrair e manter pessoal sem grandes compensacoes financeiras.
Quando incorporam objetivos comerciais, elas perdem esta
capacidade e tem que repensar seus mecanismos de compensacoes.
As ONGs tenderiam a buscar no passado, os criterios para definir
a sua acao, uma vez que, sendo conhecidos e experimentados,
transmitiriam mais sentimentos de seguranca e estabilidade.
Assim, ainda de acordo com o autor, o tratamento gerencial do
planejamento por parte das ONGs tende, dessa forma, a enfatizar
aspectos que reduzem a eficacia de sua acao. Estes aspectos
seriam: reconciliacao com o passado, buscando manter a lealdade
de seus membros e a agregacao interna baseada na lealdade 'a
missao e aos programas que lhes deram origem; reacoes a crises e
pressoes externas, ja' que a analise sistematizada e continua
para detectar oportunidades e ameacas e' praticamente
inexistente; um planejamento baseado quase que exclusivamente na
experiencia, crenca, habitos e informacoes dos dirigentes, uma
vez que inexiste uma sistematizacao e continuidade de um
planejamento baseado na geracao de informacoes validas e
utilizaveis no processo decisorio.
Por outro lado, a necessidade de gerenciar a escassez traz
problemas gerenciais internos ja' que, em epocas de cortes
orcamentarios, facilmente e' gerada uma imagem de
irracionalidade, declinio, incapacidade e ineficiencia,
dificultando a manutencao de uma imagem organizacional positiva.
Isso faz com que seja necessario a mudanca da estrategia
gerencial que parte do principio da expansao e do
desenvolvimento, para incorporar a perspectiva de declinio e
escassez. Justificar o declinio e', no entanto, uma tarefa
dificil, uma vez que cortes de recursos demonstram a reducao da
importancia da acao organizacional, dificil de ser aceito
interna e externamente. Da mesma forma, torna-se tarefa ardua
manter a motivacao do pessoal, pois se reduzem as oportunidades
de criatividade, os recursos para promocao e recompensa pela
lealdade e competencia, assim como aqueles para atrair e manter
novos talentos. Por fim, o autor afirma que, se em epocas de
abundancia a experiencia e a intuicao sao suficientes para a
tomada de decisoes, ja' que possiveis erros sao facilmente
absorvidos sem ameacar a sobrevivencia, em tempos de escassez e'
necessario maiores conhecimentos e instrumentos analiticos para
que o risco de erros possa ser minimizado.
A atuacao numa perspectiva mais comercial exige de organizacoes
sem fins lucrativos, de acordo com o autor, a implantacao de
grandes mudancas, ja' que estas estariam desaparelhadas para
desenvolver atividades que podem ou devem ser gerenciadas
comercialmente. Alem das dificuldades gerenciais para atualizar
normas administrativas, essa nova perspectiva gera conflitos de
valores e objetivos. Dessa forma, o autor elenca uma serie de
valores e praticas que devem ser reduzidas e outras tantas que
devem ser acentuadas em ONGs sem fins lucrativos que passam a
atuar numa perspectiva comercial, valores estes que, em muitos
aspectos, contraditorios ao sentido social do trabalho, enquanto
outros, podendo encerrar possibilidades de convergencia ou
identidade.
** Fim do texto de ax:ong.gestao **
/** ong.gestao: 12.5 **/
** Escrito em 6:32 AM Dec 23, 1996 por omar em ax:ong.gestao **
O quinto artigo, de autoria de Delaine Martins Costa, pretende
contribuir com a discussao sobre o papel das mulheres que
romperam o lugar que lhes foi atribuido socialmente, impedindo-
lhes o acesso ao poder formal. Assim, o artigo aborda a
incorporacao das mulheres em cargos de direcao e suas
implicacoes para o gerenciamento institucional.
A questao que a autora inicialmente coloca e' se existe ou nao
um "estilo feminino" de lideranca e gestao, considerando-se as
diferencas experiencias sociais vivenciadas por homens e
mulheres.
Sao abordados os estudos ate' agora realizados na area da teoria
organizacional, mais especificamente aqueles que tratam dos
estilos de lideranca e gestao. Estes observam muito mais a
categoria "mulheres" e sua posicao de lideres em empresas
privadas do que a categoria "genero".
As novas tendencias da ciencia da administracao, que pregam o
desenvolvimento de estruturas horizontais, com a valorizacao do
trabalho em equipe, com a descentralizacao da tomada de
decisoes, com a distribuicao de responsabilidades e rapidez no
fluxo de informacoes coincidiriam com caracteristicas da
personalidade e habilidades adquiridas pelas mulheres no seu
processo de socializacao. De acordo com a autora, a literatura
sobre o tema fala de "direcao androgina" para significar a
combinacao ideal de tracos da personalidade de ambos os generos.
Os estudos que pesquisaram a ascensao das mulheres em postos de
direcao teriam mostrado diferencas na percepcao de homens e
mulheres sobre a dificuldades destas ultimas nao ascenderem
profissionalmente. Enquanto as mulheres atribuem 'as
oportunidades no ambito do trabalho (formacao insuficiente,
iniciacao no mercado de trabalho em postos que dificilmente
levam 'a ascensao, inviabilidade de seu trabalho) as
dificuldades em ascenderem, os homens atribuem a nao ascensao
das mulheres a fatores familiares e de personalidade (nao se
atrevem a arriscar-se ou nao desejam, realmente, promocoes). Um
outro estudo indica diferentes formas de homens e mulheres
encararem o trabalho: enquanto que os homens investem na
carreira, as mulheres estariam mais preocupadas em exercer
alguma atividade interessante. E quando alcancam postos de
direcao, as mulheres negam ter chegado a eles de forma
consciente, atribuindo seu exito muito mais ao fator sorte. Da
mesma forma, homens e mulheres teriam atitudes diferentes frente
ao poder. Enquanto que, para os primeiros, o poder e' percebido
como dominio e controle, para as mulheres o poder significaria a
capacidade de produzir e promover mudancas. Esse seria o motivo
pelo qual as mulheres preferem o poder indireto, uma vez que
percebem o poder direto como limitador. Outras autoras explicam
as diferencas de percepcao de homens e mulheres com o fato de
que os homens desejam estar no centro, no topo, enquanto que as
mulheres, por sua vez, percebe o poder em forma de rede. Outros
estudos sobre mulheres executivas apontam que as mulheres, na
area governamental, tem conseguido ascender a altos postos
administrativos, principalmente em organizacoes recem-criadas,
mas nao conseguem alcancar os postos mais altos.
A partir destes estudos, a autora se pergunta que mecanismos da
estrutura organizacional - normas, padroes, criterios - impedem
'as mulheres ultrapassarem uma determinada barreira e galgarem
aos postos mais altos. Ela levanta tambem a questao sobre que
papeis homens e mulheres exercem no processo de producao de
subjetividades dentro das organizacoes que contribuem para a
afirmacao das relacoes instituidas.
A autora aponta tambem para aqueles estudos que analisam as
caracteristicas de organizacoes que desenvolvem mecanismos que
propiciam a ascensao da mulher, tais como oferecer beneficios
familiares, manter uma ambiencia favoravel e facilitar o
desenvolvimento profissional. A flexibilizacao da jornada de
trabalho e' apontada como outro fator que facilitaria a ascensao
das mulheres dentro das organizacoes. As praticas atuais de
gestao tambem valorizariam atributos tradicionalmente
considerados femininos, uma vez que exige-se habilidades tais
como organizacao, capacidade de gerenciar conflitos de forma
equilibrada, guiar, dirigir, monitorar, manejar os conflitos e
repartir as informacoes. Reformas da lei, para que todas as
empresas, a partir de um determinado porte, incorporem mulheres
nos varios niveis salariais de acordo com sua representacao na
forca de trabalho, tambem contribuiriam para um equilibrio maior
entre os generos.
** Fim do texto de ax:ong.gestao **
/** ong.gestao: 12.6 **/
** Escrito em 6:33 AM Dec 23, 1996 por omar em ax:ong.gestao **
O sexto artigo, de Delaine Martins Costa e Gleisi Heisler Neves,
trata da aplicabilidade da teoria organizacional, 'as ONGs,
principalmente 'as ONGs feministas.
A teoria organizacional classica tem como objetivo alcancar o
maximo de produtividade e eficiencia em organizacoes cada vez
mais complexas, numerosas e competitivas, visando o aumento da
rentabilidade do capital investido. As ONGs, em contraposicao,
nao buscam o lucro, nao admitem a apropriacao privada de seu
patrimonio, sao socialmente comprometidas e "contestam os
modelos e conceitos convencionais de poder nas organizacoes e na
sociedade, bem como suas formas de legitimacao e exercicio" (pag.
62).
As autoras abordam o desenvolvimento da teoria organizacional
desde o seu surgimento, dentro de uma visao positivista. Esta
seria determinada pela "racionalidade funcional" ou
"instrumental", que se baseia na relacao mecanica entre meios e
fins, estando em contraposicao 'a "racionalidade substantitva",
que se apoia na estrutura etico-normativa.
Assim, a racionalidade instrumental leva a que as pessoas se
amoldem ao projeto organizacional estabelecido e induz ao
corporativismo e 'a obediencia. O segundo modelo, o da
racionalidade substantiva - induz 'a criatividade, 'a inovacao,
uma vez que todos aqueles envolvidos no processo sao encorajados
a refletir sobre suas acoes.
De acordo com as autoras, embora de forma sutil, a racionalidade
instrumental ainda se faz presente nas politicas e praticas das
organizacoes. A titulo de exemplo, cita a participacao, aplicada
como mero instrumento para reduzir a resistencia a mudancas
dentro da organizacao. A racionalidade instrumental teria se
transformado na fonte de legitimacao do poder de uma nova
categoria social: a dos administradores e gerentes
profissionais. De acordo com as autoras, o administrador
profissional veio a substituir a intuicao dos primeiros
administradores do seculo XIX. A enfase passou a ser as analises
sistematicas, as rotinas de trabalho, o planejamento da producao
e a avaliacao dos custos.
A etica masculina, desenvolvida dentro de uma sociedade
patriarcal, teria agravado a influencia da racionalidade
instrumental ao manter, pela divisao sexual do trabalho, as
mulheres no espaco domestico. Com isso, a teoria organizacional
teria incorporado apenas a visao masculina de gestao,
valorizando aspectos como ambicao, logica, agressividade,
competitividade, etc., ao tempo em que desprezou aqueles
atributos considerados femininos como a emocao, a intuicao, a
sensibilidade, a capacidade de persuasao, etc.
Mas e' a propria teoria organizacional que vem desempenhando um
papel critico em relacao 'a impropriedade no acompanhamento, na
antecipacao e na formulacao de respostas adequadas para o
processo de mudancas atualmente em curso. Ela passou a
questionar a visao mecanicista do tipo causa-efeito entre
ocorrencias no ambito da organizacao, consideradas controlaveis.
Nao somente as organizacoes estao sujeitas 'as influencias do
ambiente externo, como elas estao, a todo momento, redefinindo e
replanejando em funcao de uma serie de outras variaveis nao
previstas. Com isso, ela passou a propor formas de organizacao
mais flexiveis e ageis para o enfrentamento da instabilidade e
incertezas dos tempos atuais. Avancos teoricos importantes
referem-se 'a critica da dicotomia entre planejamento, tomada de
decisao e execucao.
Assim, e' a propria teoria organizacional que poe em xeque a
racionalidade, valorizando a complementaridade entre razao e
intuicao. Com isso, passa-se a valorizar os estilos femininos de
gestao. Nesse sentido, as autoras acreditam que a teoria
organizacional - embora voltada para a empresa privada - possa
oferecer um instrumental de analise valido para organizacoes nao
governamentais, do assim chamado Terceiro Setor.
As autoras ressaltam que as ONGs, pelas suas caracteristicas, se
diferenciam das organizacoes publicas e privadas pela sua
"racionalidade substantiva", dado sua estrutura etico-normativa.
Com isso, o desenvolvimento atual da teoria organizacional se
aproxima da cultura das ONGs, que valoriza a flexibilidade, a
descentralizacao, a simplificacao, a capacidade de inovacao e a
rejeicao ao burocratismo.
No entanto, 'a medida que as ONGs passam a, por varias razoes,
substituir a espontaneidade, a informalidade e a acao bem-
intencionada mas desorganizada por praticas ja' utilizadas por
organizacoes que se orientam pela racionalidade instrumental,
surge uma tensao entre aqueles novos valores que se busca
afirmar com aqueles caracteristicos da sua cultura
organizacional e ligados 'a racionalidade substantiva.
As autoras relacionam e descrevem quatro "dilemas" enfrentados
pelas ONGs latinoamericanas quanto ao seu desenvolvimento
organizacional: o dilema do financiamento, o dilema da
profissionalizacao, o dilema do planejamento continuo, global e
estrategico e o dilema da (re)estruturacao administrativa.
Por fim, as autoras descrevem o surgimento, no contexto da
cooperacao internacional, da estrategia de fazer das
organizacoes agentes de mudancas sociais, uma vez que estas
foram consideradas capazes de mobilizar recursos, assim como
difundir novos valores e atitudes, conhecimentos e tecnologias.
Isso pressupunha a transformacao das organizacoes em
instituicoes; o desenvolvimento institucional ou a
institucionalizacao organizacional seria o cerne desta mudanca,
cujos marcos teorico e conceitual teriam surgido nos anos 60.
Nesse ponto as autoras trabalham com os conceitos de
desenvolvimento organizacional para conceituar o processo de
introducao de mudancas organizacionais deliberadas e planejadas
nas organizacoes de maneira geral e o de desenvolvimento
institucional para caracterizar o processo de
institucionalizacao das ONGs, buscando relacionar estes dois
conceitos. Dessa forma, o desenvolvimento organizacional seria
um instrumento para a promocao do desenvolvimento institucional
das ONGs.
** Fim do texto de ax:ong.gestao **
Anterior
<-- Mensagem -->
Próxima
Para maiores informações, envie e-mail para:
elo@ongba.org.br